Desde 1968 - Ano 56

32.6 C
Dourados

Desde 1968 - Ano 57

InícioEstadoQuase 30% das mortes em MS não têm causa definida, aponta Ministério...

Quase 30% das mortes em MS não têm causa definida, aponta Ministério da Saúde

Em apenas um ano, mais de 5,3 mil óbitos em Mato Grosso do Sul ficaram sem causa claramente determinada. Na prática, isso significa que inúmeras famílias não receberam uma explicação objetiva sobre o que realmente levou à morte de seus entes queridos — algo que impacta não só o luto, mas também o planejamento em saúde pública.

De acordo com o Painel de Monitoramento da Mortalidade do Ministério da Saúde, MS registrou 18.790 mortes em 2024. Destes, 5.305 (28,2%) foram anotados como “causa básica inespecífica ou incompleta” — os chamados garbage codes (códigos-lixo). Ou seja: quase uma em cada três mortes no estado não teve sua causa básica devidamente identificada.

O painel examina também em quais capítulos da CID‑10 esses casos aparecem: incluem-se aí sintomas pouco definidos e doenças dos sistemas circulatório e respiratório, porém sem precisão. No grupo de infecções e parasitoses, por exemplo, há 203 mortes distribuídas entre categorias como neoplasias, doenças endócrinas e transtornos mentais — todas sem especificar claramente a origem. O maior volume está em “sintomas e sinais maldefinidos”, com 803 registros no ano.

Em maio, MS teve o maior número de mortes sem causa definida: 530 casos; em dezembro, esse número despencou para 286, o que pode indicar tanto falhas no processo de notificação quanto períodos de sobrecarga no sistema de saúde. Sem um diagnóstico claro, torna-se bastante difícil saber quantas mortes foram realmente por câncer, por doenças crônicas, infecções ou acidentes.

A Secretaria de Estado de Saúde reconhece que esses números representam um desafio nacional ligado diretamente à qualidade com que se preenche a DO (Declaração de Óbito) — documento de caráter legal e ético, de responsabilidade exclusiva dos médicos, conforme normas do CFM (Conselho Federal de Medicina). “A identificação correta da causa básica do óbito é essencial para assegurar dados confiáveis”, afirma a SES.

Além disso, causas mal definidas comprometem gravemente a precisão das estatísticas vitais e atrapalham a formulação de políticas de saúde eficazes. Conforme a SES, “a falta de informações clínicas detalhadas, a carência de exames complementares ou de necropsia em determinados casos, e falhas no preenchimento apropriado da DO” estão entre os principais fatores que agravam esse cenário.

O problema não é novo. Em 2021, no auge da pandemia de covid‑19, o uso de classificações incorretas ou incompletas de causa de morte disparou. Em MS, dentre os 25.049 óbitos daquele ano, 11.824 foram registrados com causa básica incompleta. Segundo a SES, isso refletiu o grande volume de óbitos em curto espaço de tempo, somado à sobrecarga dos serviços de saúde e à limitação para diagnósticos conclusivos.

No Brasil como um todo, foram 898.156 mortes marcadas como garbage codes num universo de 1.832.649 óbitos registrados — um problema que potencializa a dificuldade de monitorar doenças, acidentes, violências ou epidemias.

Do ponto de vista emocional, a falta de respostas produz um impacto profundo no luto. Saber por que se perdeu uma pessoa amada dá algum alívio — quando isso não acontece, abre‑se uma lacuna dolorosa que muitas vezes não se fecha. O psicólogo Edilson dos Reis, que coordena o Núcleo de Estudo, Pesquisa, Assistência, Extensão e Apoio ao Luto da UFMS, afirma que “a incerteza sobre a causa da morte intensifica o sofrimento, pois faltam elementos essenciais para compreender e aceitar a perda”.

Ele ressalta que o acolhimento psicológico pode ajudar muito: oferecer espaço para expressar emoções, legitimar sentimentos e respeitar o tempo de cada um. Porém, sem clareza sobre o que de fato causou o falecimento, muitas famílias ficam presas à dúvida, com risco de desenvolverem ansiedade, depressão ou senso de culpa.

Para a apuração oficial, casos sem definição inicial passam por investigação policial e perícia. Quando a causa não pode ser estabelecida de pronto — seja por ausência de laudo ou mesmo indício de causa violenta ou natural —, o laudo pericial definitivo é elaborado posteriormente, culminando no registro oficial.

O Jornal Midiamax destaca que um dos grandes desafios para reduzir esses registros mal definidos é capacitar médicos, reforçar exames laboratoriais ou necropsias e garantir que os Serviços de Verificação de Óbitos (SVOs) sejam operantes em unidades como Campo Grande e Dourados. Isso permitiria atingir o percentual desejado de causas bem definidas e oferecer melhores dados para políticas públicas. (J.B)

- Publicidade -

ENQUETE

MAIS LIDAS