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‘Os donos do mundo’, por Elairton Gehlen

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Elairton Gehlen – escritor –

A noite passada eu tive um pesadelo e quase acreditei que poderia ser verdade, acordei e não pude mais dormir, o dia já era de manhã e clareava pela janela, então levantei e, depois do café fui andar pela rua e parecia que toda Dourados tinha tido um pesadelo. Qualquer douradense que tenha saído à rua às sete horas dessa manhã, ao encontrar um conhecido e, depois de lhe perguntar se está tudo bem e ter a resposta mais mentirosa que se diz todos os dias durante o dia todo: “tudo bem, e tu? ”e, em seguida, sabendo que nem ele e nem o conhecido estão mesmo bem, porque em julho geralmente não se está bem por aqui, tocar de leve no ombro dele e confessar sinceramente que teve um pesadelo, provavelmente o conhecido haverá de ser tomado de sinceridade e admitir que o pesadelo de verdade é o que se vive a cada dia quando se anda de carro por todas essas ruas esburacadas e, observando um buraco qualquer da rua, logo depois de parar o carro para ver se não entortou o aro da roda, olha para o buraco e vê que o asfalto que deveria durar pelo menos uns dez anos e foi feito a menos de quatro, esse mesmo asfalto não passa de uma casca de ovo com o formato da superfície da lua, fica com vontade de sair esbravejando que isso é um pesadelo! 

Pesadelos têm uma duração curta, cerca de quinze a vinte minutos, então não se pode dizer que os buracos das ruas sejam um pesadelo, eles estão ali há anos! a menos que comparemos o tempo do trajeto que fazemos de carro até chegarmos ao centro da cidade onde iremos ansiosamente parar próximo de uma bomba de gasolina e perguntar ao frentista quanto custa o litro do combustível e ele nos dirá sorrindo que teve mais um aumento e agora já está passando dos sete reais e daí pedimos a ele que demore, por favor, pelo menos um pouco mais do que vinte minutos para abastecer, mas ele dirá que não pode esperar tanto, o tempo máximo é de quinze minutos, pois vem outros motoristas e geralmente estão impacientes, querem abastecer rápido, porque perderam muito tempo com as ruas esburacadas e agora estão bem atrasados para seus compromissos, como se o ano já estivesse no fim, e ainda estamos em julho, então respiramos fundo e vamos até o caixa do posto de gasolina e passamos o cartão com a certeza de que no próximo vencimento haveremos de ficar olhando para a fatura por trinta minutos, um pouco mais de tempo que o determinado para o pesadelo. 

Com a fatura do cartão de crédito na mão observamos, sem nenhum desejo de observar, os valores relacionados e automaticamente abrimos a gaveta da escrivaninha, a primeira gaveta, onde está a calculadora, e com ela vamos somando o quanto se gastou com o supermercado: um absurdo! Olhei pela janela e meu vizinho esbravejava com uma folha de papel na mão: “Um absurdo…” Então tive uma ideia: Se todos douradenses programassem o vencimento da fatura do cartão para o mesmo dia do mês, a cidade sofreria um tremor e os muros do poder público cairiam como os de Jericó!  

Meu filho voltou da faculdade as dez e meia da noite e eu perguntei a ele se acreditava mesmo que os muros da cidade fortalecida de Jericó haviam sido derrubados por causa dos gritos do povo, ele disse que sim, se estava escrito na Bíblia era verdade, fui dormir convencido de que se o povo gritasse de verdade cairiam os muros do Palácio do Planalto e poderíamos ocupar aquele lugar e fazer um país melhor, vamos gritar bem forte, gritou meu filho do seu quarto enquanto eu vestia meu pijamas, Agora?, perguntei, não, em dois de outubro!, e foi dormir, essa noite não tive pesadelos. 

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