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Nossa Feira Livre, personagens e suas trajetórias de vida: Marcolino do Travessão da Figueira

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Ilson Boca Venâncio –

Certo dia sai de casa disposto a conseguir conversar com o Marcolino e como havíamos combinado, uma conversa sobre a trajetória de vida e sua relação com a Feira Livre. Esse personagem é muito rico em sua história, pela sua trajetória e posicionamento. 

Nascido em uma família de nove irmãos, começou a vir na Feira Livre ainda pequeno.  Conta que vinha na garupa do cavalo de sua irmã mais velha.

Ela fazia polvilho e farinha de mandioca durante a semana para no sábado vender na Feira Livre. Assim, Marcolino foi acostumando com aquela vida e logo virou feirante.

Naquela época a Feira era no centro, próximo ao Bar Brasil, onde funcionava uma torrefação e moagem de café.

Sempre que vou para entrevistar uma pessoa bem vivida já me preparo para o novo, pois esses relatos sempre surpreendem!

Eu havia chegado na Feira no momento em que ele estava terminando de montar a banca, ainda não havia o movimento da freguesia, e ele estava sentado, descascando feijão de corda.

Assim que iniciamos a conversa começaram a chegar os primeiros fregueses. Entre uma conversa, com a freguesia que acabava participando do nosso papo que se deu essa entrevista, outros transeuntes que passavam também pegavam uma conversinha.

O bom da Feira Livre é os encontros com amigos e essa liberdade da conversa. Essas coletas das histórias sempre revelam trajetórias de vida muito emocionantes a exemplo do Marcolino.

Ele vem de uma família de nove irmãos, seis homens e três mulheres. Filho de Pedro Clarindo de Souza, natural de Juazeiro da Bahia, e Antonina Rodrigues de Souza. A família veio da Bahia para Sorocaba-SP, onde moraram por algum tempo para depois vir para Dourados, em 1944.

Seu pai requereu um lote no Travessão da Figueira, nome dado aquela localidade, segundo ele, devido a existência de uma enorme figueira que havia numa esquina.

Próximo a figueira fora construída a Escola Rural Mista da Figueira onde ele e seus irmãos estudaram.

Ele me conta que a derrubada daquela Figueira custou muito trabalho aos malfeitores, que tiveram que ir queimando aos poucos até destruí-la.

De acordo com ele, aquela árvore deveria ocupar uma área de uns cem metros cúbicos de diâmetro, por isso, eram necessários muitos homens de braços compridos, para abraçar o seu tronco.

Em sua opinião, uma árvore daquela deveria ser preservada como relíquia, e nunca ser derrubada, pois passam muitas gerações humanas, enquanto a árvore permanece firme!

Marcolino começou a participar na Feira Livre quando ela acontecia na atual Rua Nelson Araujo entre a Av. Marcelino Pires e Rio Grande do Sul (Rua dos Velhacos) atual Weimar Torres.  Neste local havia o Bar do seu Adolfo –  Bar e Torrefação de Café Brasil.

Ali também passava a jardineira mista que fazia a linha até o Panambi, passando pelo Bolicho Queimado e Cooperativa, e Vila Douradina. Marcolino me diz que no tempo do Getulio Vargas as coisas eram melhores para os colonos: “Nós tínhamos o apoio do governo Federal, através da cooperativa, que nos fornecia alimentos, sementes e ferramentas; já naquela época quando tratores era coisa rara, a colônia já tinha as máquinas para ajudar o agricultor”.

Havia um propósito do governo para que o projeto desse resultado satisfatório.

Ele conta que com o fim do governo social, as coisas ficaram muito difíceis. Os colonos se sentiam desamparados sem o apoio do governo, e logo veio a exploração e essa sempre vem em cima de quem produz.

 Aí o jeito era se virar e quem tinha o lote mais perto da cidade, se virava na Feira vindo de bicicleta, a cavalo, de carroça e traziam o que tinham para vender.

Marcolino, é o quarto entre os nove irmãos: Maria do Carmo de Souza, Antonio Ferreira de Souza, Mario de Souza, Sinval, Maria Lucia, Manoel, Aparecido, Ilma  e Marcelino.

Com o passar do tempo toda a família foi se envolvendo com o trabalho na Feira. Marcolino diz que, da mesma forma que sempre teve muito apetite para o trabalho, tem pela vida.

Uma das coisas que gostava de fazer era jogar bola, isso desde menino. São-Paulino de coração, conta com entusiasmo seu tempo de atleta na juventude.

Quando jogava no Botafogo do Bolicho Queimado, de lateral esquerdo, era bom no drible. Quando pegava a bola, o ponteiro já abria para o meio para receber, pois sabia que o destino era o cruzamento.

Rápido na corrida, procurava sempre chegar na bola à frente do adversário, evitando o choque de corpo, se adiantando com a bola pela esquerda, sempre cruzava de forma a provocar o gol ou um bom arremate à meta do goleiro. Com um drible rápido, e sempre que o zagueiro adversário tentava desarmá-lo levava a bola no meio das pernas do marcador, trazendo rapidamente de volta.

Muitas vezes na tentativa de evitar o drible, fechando as pernas, o adversário acabava caindo, o que provocava muitos risos da torcida.

Recorda com entusiasmo os amigos de bola da região do Barreirinho, Potrerito, Três Bolichos e Barreirão.

Lembra com satisfação do “Lazinho”, que além de ser um bom jogador, o incentivava a jogar. Recorda de um torneio que o seu time Botafogo conquistou no campo do Vasconcelos.

Eram muitos times, e eles foram para a final contra os donos da casa. Ele que já havia jogado todos os jogos, cansado acabou por entrar no jogo da decisão na final.

Com o jogo em andamento acabou fazendo a jogada que decidiu a partida dando ao Botafogo o troféu de campeão do torneio. “Foi um jogão de bola”. Acrescenta ele!

Ele me conta que depois de sair por aí, a procura de sonhos, logo chegou a idade de servir o Exército Brasileiro. No pelotão de Comunicação chegou ao posto de cabo.

Para ele, o Exército lhe ensinou a disciplina e persistência quando se quer vencer. Mas assim que retornou do quartel, voltou a trabalhar no sitio com os pais e aí retornou à Feira Livre.

Em 1973, Marcolino casou-se com Elida Barros de Souza, tendo fruto do casamento, os seus três filhos, Marcos Klely de Souza, Marcelo Ferreira Souza e Ilço Aguiar de Souza. O que resultou até a data que este texto foi escrito no nascimento de quatro netos, são eles, Juliana, Carlos Henrique, Giovanna e Pedro Lucas.

Conversando com Manoel, irmão de Marcolino, e que também tem uma banca na Feira Livre há mais de vinte anos, ele me contou que na família os trabalhos são divididos – cada um cuida de uma parte na produção, distribuição e vendas.

Manoel lembra com saudade da colônia, dos tempos em que as pessoas eram unidas.

“Quando alguém tinha um serviço grande para fazer, seja um rancho, uma colheita, ou uma estrada, logo se organizava um mutirão, aí o dono da casa, carneava um animal e preparava um bom banquete, e tudo terminava em festa com música e dança. Hoje não tem mais nada disso”, afirma Manoel.

Disse que tudo no começo é bom, assim foi na colônia, que no principio tinha um ideal depois foi mudando, assim também foi a nossa Feira Livre, que a princípio, quando foi oficializada pelo poder público, não se pagava imposto. Mais assim que as vendas melhoraram, passaram a cobrar.

Conta que os produtos mais vendidos como porcos e galinhas, carne de boi, que tinham uma boa saída, a taxa era calculada pela quantidade de cabeças: “O fiscal vinha e contava as cabeças para estipular o valor da taxa”, lembra.

Para ele as relações entre feirantes e gestores públicos deveriam ser transparentes e objetivas, com cada um cumprindo a sua parte com respeito e dedicação.

Só assim para dar mais segurança aos feirantes e consumidores, garantindo a Feira Livre e agradável de participar.

Perguntado sobre a mudança de local e modelo de organização, ele me diz que seria como mudar uma árvore que nasceu e cresceu em um lugar, para replantar em outro local, vai precisar de muitos cuidados para que ela vingue.

Ele diz ainda que torce para que a vida da Feira sempre melhore, para que os seus filhos e netos que hoje já fazem parte dessa história possam continuar firmes no propósito de produzir alimentos de qualidade, manter a tradição de feirantes e agradar a freguesia.  Manter essa tradição da nossa família!

Ao Marcolino e Manoel, eu só tenho que agradecer pela boa conversa que me gerou esta história.

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