Redação –
O desembargador aposentado e ex-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), Paulo Alfeu Puccinelli, foi condenado por improbidade administrativa por ter autorizado o pagamento irregular de um precatório de R$ 25,5 milhões ao empresário Jamil Name, fora da ordem legal estabelecida pela Constituição.
A decisão, assinada nesta sexta-feira (7) pelo juiz Eduardo Lacerda Trevisan, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, aponta que a manobra provocou prejuízo de R$ 9,7 milhões à Prefeitura de Campo Grande e enriquecimento ilícito de R$ 170 mil por parte do magistrado.
Pagamento fora da ordem legal
De acordo com a sentença, o caso teve início a partir de uma ação do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), movida em 2021. O órgão acusou Puccinelli de quebrar a ordem cronológica de pagamento de precatórios para beneficiar Jamil Name, que à época alegava problemas graves de saúde para antecipar o recebimento do valor.
O juiz, porém, ressaltou que o crédito não tinha natureza alimentar — único tipo que permite antecipação legal — e que, ainda assim, Puccinelli concedeu liminar em 10 de julho de 2009, liberando o pagamento de R$ 25.564.605,64 referentes a uma indenização pela desapropriação de área para a construção da Avenida Mato Grosso.
O precatório pertencia originalmente a Berta Eluf Dualibi, que havia cedido seus direitos a Name. Com a decisão favorável, o empresário passou a pressionar o então prefeito Nelsinho Trad para efetuar o pagamento. A Prefeitura acabou firmando acordo para quitar o valor em 13 parcelas de R$ 1,3 milhão.
Após a primeira transferência, Jamil Name vendeu o crédito aos empresários Jorge Haddad e David Haddad Neto, o que desmentiu o argumento humanitário apresentado para a antecipação. A operação despertou atenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que, em abril de 2010, suspendeu os pagamentos ao constatar irregularidades. Naquele momento, o município já havia desembolsado R$ 9,7 milhões, quantia que agora deverá ser devolvida.
Enriquecimento ilícito e movimentações suspeitas
Durante a investigação conduzida pelo Grupo Especial de Combate à Corrupção (Gecoc), o MPMS identificou movimentações financeiras atípicas em nome de Puccinelli, incluindo depósitos fracionados de R$ 80 mil em espécie realizados entre 2009 e 2010. Embora o magistrado não tenha admitido a origem ilícita dos valores, perícia judicial constatou aumento patrimonial de R$ 170 mil sem origem comprovada no período.
Na sentença, que tem 45 páginas, o juiz Trevisan afirmou que o desembargador tinha plena consciência da irregularidade e violou o artigo 100 da Constituição Federal, que determina o respeito à ordem cronológica nos pagamentos de precatórios.
O magistrado considerou que Puccinelli causou dano ao erário e se beneficiou financeiramente, configurando ato de improbidade administrativa.
Condenação e valores atualizados
Puccinelli foi condenado a devolver R$ 170 mil obtidos de forma ilícita, ressarcir R$ 9,7 milhões à Prefeitura de Campo Grande e pagar multa civil no mesmo valor de R$ 170 mil. Todos os montantes serão corrigidos pela taxa Selic desde 31 de dezembro de 2010, o que eleva a dívida total para cerca de R$ 40 milhões.
A sentença também determinou o registro da condenação no Cadastro Nacional de Condenações por Ato de Improbidade Administrativa.
Caso inédito no Judiciário de MS
O juiz destacou o caráter inédito da decisão, ressaltando que se trata da primeira condenação de um desembargador do TJMS por improbidade administrativa. Segundo Trevisan, a conduta do réu foi “livre e consciente”, sem qualquer justificativa jurídica ou humanitária para a quebra da ordem de pagamento.
Ainda cabe recurso contra a decisão.
A reportagem tentou contato com a defesa de Paulo Alfeu Puccinelli, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto. O espaço segue aberto para manifestações futuras.

