Mariana Rocha –
Em uma série especial sobre o impacto da educação superior na vida de profissionais indígenas, a Folha de Dourados está contando a história de alguns entrevistados, destacando a formação acadêmica em suas vidas, passando por conquistas, desafios, lições aprendidas e conselhos deixados para as próximas gerações.
A segunda entrevista da série é com o Advogado Indígena Wilson Matos da Silva, da etnia Terena. Aos 61 anos, formado em ciências jurídicas pela Unigran (Centro Universitário da Grande Dourados), Dr Wilson conta um pouco de sua trajetória, destaca a importância que não só o curso, mas também a instituição deram a sua presença dentro da universidade.
“Conquista de respeito, enfrentamento do preconceito e quebra de paradigmas”, esses foram os pontos-chave desta entrevista, onde o Advogado Wilson Matos narra, inclusive, as vezes em que foi descredibilizado por profissionais do serviço notarial e até mesmo confundido com pastor. “Eles não se acostumam ao ver um índio de terno e gravata”.
Pode me relatar como a conclusão da faculdade mudou a sua vida e a vida de outras pessoas próximas de você?
“ O curso superior abriu os meus horizontes, aumentou o meu conhecimento e a auto estima, na minha valorização pessoal enquanto ser humano, me trouxe o reconhecimento e o respeito dos operadores do Direito.
Na vida dos meus patrícios que também conseguiram alcançar, como muito esforço e sacrifício, vejo que ganharam na auto estima e dignidade, são partes úteis e importantes para a transformação de nossas comunidades tradicionais em uma “sociedade” ou “comunidade” , transformações essas cada vez mais exigida de nossos povos, especialmente as situam-se próximos a grandes centros urbanos como é o nosso caso em Dourados.
Eu diria que a educação nos propicia uma integração, lenta, gradual específica e diferenciada conseguimos aceitar a cultura européia introduzida pela globalização, e inserimos parte da nossa cultura construindo um Brasil pluriétnico que é desde os primórdios
Como indígena, você sofreu preconceito dentro da universidade?
Não tem como não sofrer, fui um dos primeiros indígenas formado em uma ciência que até pouco tempo era restrito a elite e após a colação de grau continuei quebrando os paradigmas, fui o primeiro Indígena a requerer a carteira da OAB MS, obviamente o primeiro aprovado em seus concursos, por todas essas façanhas.
Bem, quanto ao preconceito, por vir do corte de cana nas usinas de álcool, os atos discriminatórios aconteciam com muita frequência, na entrada do fórum uma senhora me perguntou se eu era pastor, por estar de terno e gravata, nas secretarias e cartórios quase sempre era confundido, solicitei a extração de uma certidão a moça me perguntou se eu estava com o meu advogado, dentre outras
Quem mais te apoio durante a faculdade?
“Não entrei pelas cotas e não tive bolsa permanência, mas fui beneficiado por uma importante iniciativa que foi pactuada muito antes das ações afirmativas. O Programa de Apoio ao Estudante Indígena (PAEI), convênio feito entre FUNAI e UNIGRAN. Graduei com apoio das duas instituições e pós graduei com apoio de uma instituição Indígenas UARÃN Instituto indígena. Serei sempre grato a eles que me auxiliaram. A minha força para continuar sempre veio do alto, minha fé em Deus, a vontade de vencer. E claro, o apoio da família, mulher e filhos foram importantes.
Hoje, qual mensagem você diria para todos os indígenas que pensam em entrar em uma faculdade?
Hoje a facilidade é maior, lutei no movimento e ainda estou lutando. Agora, temos recebido muitos auxílios do poder público, no entanto, devido ao retrocesso no governo Bolsonaro muitas conquistas foram perdidas. A esperança é que o novo presidente restabeleça e aumente os incentivos, para que os nossos filhos se formem
Minha mensagem é de fé, otimismo e esperança; fé me um Deus que tudo pode e que nos fortalece; otimismo porque os povos indígenas são a origem do povo brasileiro, um povo forte, alegre e pujante; Já a esperança é na aceitação da diversidade de povos e línguas que nós representamos para o Brasil.
Por último, gostaria de dizer a cada novo “Guerreiro da caneta”: Não desista, persista pois as nossas comunidades precisam de cada um de nós, lembrem-se a educação é a única libertação de um povo.