Desde 1968 - Ano 56

24.7 C
Dourados

Desde 1968 - Ano 56

InícioCultura'Histórias do Chamamé em Dourados', por Ilson Boca Venâncio

‘Histórias do Chamamé em Dourados’, por Ilson Boca Venâncio

- Advertisement -

Por Ilson Boca Venâncio –

Quando o professor Munir me convidou para compor com ele a ONG, ele me sugeriu como primeira tarefa escrever um texto sobre a cultura do Chamamé, Polca e Rasqueado, ritmos fortes de origem Guarani porque o Festival tinha como objetivo divulgar essa cultura.

Logo percebi que essa cultura de tão comum a nós, até passa despercebido e nem havia refletido sobre a sua dimensão e importância.

Comecei a buscar na memória, um começo para essa história. Lembrei-me quando  pequeno, minha casa fazia fundos com o Clube Social, e eu ficava na cama ouvindo o baile e imaginando o que estava acontecendo lá dentro do salão.

Quando os músicos tocavam a seleção de ritmos Guaranis como Polca, Rasqueado ou Chamamé, o que era obrigatório em se tratando de um baile no Clube Social de Dourados, dava para perceber pelo  que eu ouvia, a alegria entusiasmante dos participantes do baile. Ouvia  os gritos, os arrastar dos pés no salão e isso deixava claro a satisfação de quem estava lá bailando.

Depois na minha adolescência e juventude vi que era assim em todos os lugares e nos bares, salões de bailes e nas boates. Conheci tantos músicos amantes dessa cultura!

Tudo isso confirma a popularidade desses ritmos, alegre e confortável para bailar. Músicas de raízes profundas nessa terra guarani, verdadeira trilha sonora da nossa cidade marcada também na cultura, na dança, na culinária, lendas e histórias antigas, coisas com que sempre convivemos.

 Quando fui buscar na história a primeira gravação de uma música do ritmo Chamamé, encontrei em 1931 por um cantor paraguaio, Samuel Aguayo, que gravou na Argentina a pedido da RCA Victor. Essa gravadora solicitara que ele gravasse uma música popular recolhida da região Correntina. 

Assim combinando uma parceria para compor letra e música entre o compositor Francisco Pracánico com a letra do poeta Diogo Novillo Quiroga compuserem a música Corrientes Poty e denominaram o ritmo de “Chamamé”, que no sentido da palavra quer dizer “feita de improviso, as pressas”.  

Há relatos também na história, que essa música brota em várias regiões e países, o que demonstra ser uma música de raízes profundas neste antigo território tradicional Guarani.

'Histórias do Chamamé em Dourados', por Ilson Boca Venâncio

Voltando à minha infância fui buscar algumas recordações e lembrei-me de quando eu era menino,  transitando entre a nossa casa na cidade e o nosso sitio na Colônia Federal, indo com meu pai nesse trajeto que fazia na garupa da bicicleta, ou de carroça e nesse caminho passava em frente à casa do Sr. Marcilio Lima, músico tradicional de naturalidade argentina.

Marcilio viera para Dourados bem moço residindo na Estrada do Porto Cambira de frente à casa dos Pedroso, segundo me contou o seu filho Cedar Vargas.

Quando eu os conheci já moravam na Colônia Federal, na Linha do Barreirinho. Ele era um homem prático e versátil na lida com as coisas da época, tanto na agricultura como na criação de animais, construção de casas, carpintaria entre outras atividades e dentre elas a mais comum a todos estava a música.

Da música que veio da sua cultura de origem, o tango, tocava também o Chamamé, a Polca, a  Guarânia, o Bolero, entre outras da cultura  tradicional em nossa  terra.

Quando se nasce e vive em uma região tão farta em diversidade cultural e de história de  tão profundas raízes, leva a versatilidade do músico muito além, compondo um estilo original na sua música e isso deu a ele a fama nos seus trabalhos.

Marcilio trazia na sua música, uma magia que ao ouvir nos traduzia a origem e o sentimento profundo da nossa alma, nos transportando para um mundo antigo de histórias e lendas antigas de bem antes dos europeus que chegarem aqui nesse território Guarani. 

Sua capacidade de músico o levou a interpretar todos os ritmos tradicionais, seus conjuntos que formou para tocar em bailes e festas se tornaram famosos pela beleza de suas músicas e a capacidade de seus músicos.

Quando tive o propósito de escrever sobre esse assunto, logo fui buscar na memória a sua trajetória.

Lembro muito bem quando a carroça do meu pai atravessava a mata da picadinha, e virava rumo a Serraria, o vento soprava o som de música Guarani vinda do Bolicho do Caraicho, que ficava na esquina do Potreirito. Meu pai sempre parava ali para comprar carne, e logo seguíamos em direção ao Travessão dos Três Bolichos.

'Histórias do Chamamé em Dourados', por Ilson Boca Venâncio

Quando nós virávamos no Travessão dos Três Bolichos, na Linha do Barreirinho rumo à casa do seu Marcilio, já se ouvia os acordes de sua sanfona, quase sempre acompanhada pelos  violões dos amigos Meneco, Romeu, e do filho Cedar Vargas, e logo todos os meus sentidos se envolviam naquela música que soava às vezes quase como um lamento.

Eu me lembrava da minha mãe, pois aquela música se confundia com tantas outras, que ela  cantava durante os seus afazeres na cozinha!

E quanto mais a carroça se aproximava em direção a casa do Marcilio, mais alto ia ficando, maior a emoção pelo prazer de ouvir. Quando passávamos pela casa, eu via através das frestas a luz do lampião o movimento dos músicos, a música que saia pelo clarão das frestas, janelas, portas, seguia agora com o volume decrescendo, conforme a distância aumentava e a música ia diminuindo. Às vezes o vento levava, depois trazia de volta!

Mesmo quando não podia mais ouvir, ela ainda permanecia no imaginativo, onde permanece ainda hoje.

Para me ajudar a contar um pouco dessa música (ritmo) e das histórias desse tempo, fui procurar alguns amigos músicos que participaram desses momentos. O primeiro que visitei e vou contar sobre nossa conversa na próxima matéria é o amigo Cedar Vargas de Lima.

Por hoje termino por aqui sendo esse o primeiro desses artigos produzido através de história oral, que tinha o objetivo de contribuir com o Festival de Chamamé, mas enquanto a pandemia não passar e o festival não vier, vamos conversando, contando um pouco da história dessas músicas que já deu destaque e imortalizou muitos dos nossos artistas!

Até a próxima.

- Advertisement -

MAIS LIDAS

- Advertisement -
- Advertisement -