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Estudante da UFGD relata transtornos após mudança de nome e gênero no registro civil

Juliel Batista –

“Como garantir a ‘universidade de todas as pessoas’ se ela não reconhece essas pessoas?”

Em denúncia concedida com exclusividade à Folha de Dourados, um estudante da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) relatou enfrentar obstáculos para exercer direitos civis e acadêmicos após alterar seu nome e seu registro de gênero no cartório.

O estudante Belka Monte, de 18 anos, ingressou no curso de Gestão Ambiental em 2025, mas afirma que não conseguiu efetuar a matrícula corretamente devido à ausência da opção “não binário” nos formulários oficiais da instituição.

Em e-mail encaminhado à universidade, Belka relatou que sua nova certidão de nascimento foi emitida em 18 de julho de 2025, pouco antes do prazo final para envio da documentação exigida, no dia 13 de agosto. Por conta disso, alguns de seus documentos oficiais, como título de eleitor, histórico escolar e RG, ainda constam com o nome e gênero anteriores.

“Considerando o curto intervalo entre a emissão da nova certidão e o prazo de envio da documentação exigida para o processo seletivo, não houve tempo hábil para atualização de todos os meus registros oficiais, como título de eleitor, certificado de conclusão do ensino médio, histórico escolar e Registro Geral”, relatou Belka. “Apesar da divergência nominal nos documentos encaminhados, todos se referem inequivocamente à mesma pessoa.”

“Apesar da divergência nominal nos documentos encaminhados, todos se referem inequivocamente à mesma pessoa.”

O estudante afirma que, desde a alteração, enfrenta diversos transtornos ao tentar acessar serviços públicos e privados. Entre os problemas, ele cita a impossibilidade de preencher formulários acadêmicos e oficiais, incluindo a matrícula na UFGD, devido à ausência da opção de gênero “não binário” nos sistemas.

Belka decidiu formalizar uma denúncia junto ao Ministério Público Federal (MPF), solicitando medidas para que os registros e cadastros sejam atualizados, garantindo seu direito de exercer cidadania plenamente. Ele também busca que a adequação de sistemas futuros seja realizada para beneficiar outras pessoas da comunidade LGBTQIAPN+, enfrentando dificuldades semelhantes.

“A partir do momento em que o Estado possibilita a alteração na certidão de nascimento, ele deve garantir a adequação em todos os demais sistemas, legislações e registros oficiais, sobretudo federais, como CPF, CNH, Previdência Social, e matrículas em instituições de ensino”, destacou na denúncia.

“[o Estado] deve garantir a adequação em todos os demais sistemas, legislações e registros oficiais, sobretudo federais…”

Gênero não-binário e legislação recente

O termo não-binário refere-se a pessoas cuja identidade de gênero não se enquadra nas categorias tradicionais de masculino ou feminino. Indivíduos não-binários podem se identificar com características de ambos os gêneros, nenhum dos gêneros ou um gênero diferente dos binários.

O Brasil tem avançado na inclusão de registros neutros. Recentemente, a nova carteira de identidade nacional passou a permitir:

  • Unificação do campo “nome”, eliminando distinção entre nome social e registro civil.
  • Extinção do campo “sexo” do documento, abrindo caminho para maior flexibilidade no reconhecimento de identidades de gênero.

Além disso, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em julgamento histórico, que pessoas têm direito à indicação de gênero neutro em registros civis, reforçando o princípio da autodeterminação da identidade de gênero.

Solicitações do estudante à universidade

Na denúncia enviada à UFGD e ao MPF, Belka pede que sejam adotadas medidas para:

  • Atualização do marcador de gênero para “não binário”, ou abertura de procedimento interno para adequação futura do sistema.
  • Garantia de que não haja impedimento ao exercício de direitos em razão da retificação do registro civil.
  • Atendimento respeitoso e adequado à identidade de gênero informada durante interações institucionais.

O estudante reforça que a adaptação de sistemas e registros é fundamental não apenas para o seu caso, mas também para a promoção de direitos iguais e o respeito à diversidade.

Ele questiona: “Como garantir a ‘universidade de todas as pessoas’ se ela não reconhece essas pessoas?” Assim, visando assegurar não apenas os seus direitos, mas também os de milhares de outras pessoas, formalizou a denúncia para lutar pelo que é constitucionalmente garantido: dignidade e reconhecimento.

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