João Roberto Giacomini- advogado, cronista e observador das relações humanas.
Há momentos em que a vida se estreita. Tudo o que era claro se dissolve, e restamos diante de nós mesmos — despidos de certezas, expostos às perguntas que sempre evitamos.
É nesse território árido que mora o abismo.
E é também ali que o ser humano se revela.
Dostoiévski entendia disso. Via na dor um caminho de revelação, e não de condenação. Para ele, o sofrimento não era um castigo, mas um espelho — um modo de enxergar a alma sem as máscaras do cotidiano. Talvez por isso suas personagens sangrem tanto: elas não fogem da queda, mergulham nela.
A verdade é que há dores que não se explicam.
Mas, se não podem ser explicadas, podem ser atravessadas.
E, quando o fazemos, algo muda em silêncio dentro de nós.
A fé — mesmo trêmula — acende uma luz pequena, o bastante para que o próximo passo se torne possível.
Ser forte não é resistir sem sentir, é seguir mesmo sentindo.
É compreender que a vida não se faz só de vitórias, mas de recomeços.
Que a alma humana, quando ferida, não se parte: se transforma.
O abismo, afinal, não é o fim — é o convite.
Convida-nos a olhar para dentro, a reconhecer a fragilidade que nos torna humanos e a esperança que nos mantém de pé.
Porque, se há algo que nos salva das sombras, não é a ausência da dor, mas a presença da fé que insiste, mansa e teimosa, em continuar acreditando.
E assim, entre quedas e recomeços, descobrimos que o homem só se conhece por inteiro quando tem coragem de encarar o abismo — e ainda assim escolher a luz.

