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Desde 1968 - Ano 56

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Elairton Gehlen: ‘As pessoas e as abelhas (Conto’

Elairton Gehlen – escritor –

Marisvaldo é um sitiante e tem uma propriedade rural no distrito de Vila Vargas, próximo do Córrego que passa pelo distrito, onde planta uma roça de mandioca que é o principal produto de comercialização. Diariamente ele arranca os pés de mandioca e leva para casa na carreta do trator Massey Ferguson 50X que comprou há três anos quando o preço da mandioca estava elevado e a safra foi muito boa, juntou o lucro da safra com as economias de anos anteriores e realizou o sonho de comprar o trator, para o que ainda faltou, fez um financiamento em 24 parcelas no Banco do Brasil. Que maravilha! Agora o trabalho está mais fácil, mais ágil e Marisvaldo  não precisa contratar trabalhadores para tantas diárias como antes.

Sentado ao volante do seu Massey Ferguson 50X, Marisvaldo vai alegremente para casa, onde Dona Marilei o espera na sombra do pé de manga para lavar as mandiocas, depois descascar, daí lavar outra vez e separar em pacotes de um quilo cada. É serviço para o dia todo. Vários dias, até o congelador se encher e Marisvaldo levar para os mercados onde os vende por R$ 3,50 o quilo, o mercado vende ao consumidor por R$ 6,50 sem ter o trabalho que Marisvaldo teve de arar a terra, plantar, capinar, colher, descascar, embalar, congelar e ainda transportar até o mercado.

– Se os humanos fossem como as abelhas, não seria desse jeito – disse Marisvaldo, no outro dia, para Dona Marilei, enquanto tomavam chimarrão antes de ir para a cidade entregar as mercadorias.

– Abelhas não plantam mandioca – respondeu Marilei, rindo e sem entender o que o marido queria dizer.

– O mercado, – disse Marisvaldo – depois que apareceu essa palavra, os animais humanos se diferenciaram dos outros animais, e para pior. Quem dera fôssemos como os outros animais, ou como as abelhas.

– O que tem as abelhas? – Perguntou Marilei ocupada com a leiteira que já fervia o leite.

O que tem as abelhas? A resposta era tão óbvia que Marisvaldo até se irritou. Será que a mulher não é capaz de pensar? Basta observar as abelhas! Enquanto a mulher esperava por uma resposta, o marido puxou do bolso uma palha de milho, encheu com o fumo cortado, enrolou a palha sobre o fumo, pôs na boca e acendeu com uma brasa do fogão, deu uma baforada bem longa e olhou para a fumaça que se ia por cima das panelas. Estava mais calmo, até sorriu.

– As abelhas, elas são insetos voadores que produzem mel com o alimento que elas tiram das flores…

– A água está quente, – observou Marilei – puxa a chaleira mais para o canto.

Marilei levantou-se da cadeira e foi coar o café, a leiteira já tinha fervido o leite e estava na beira da chapa do fogão para não derramar por cima.

– As abelhas, Mari, você me perguntou sobre as abelhas…

– Eu sei, elas fazem mel, aqui na mesa tem um pote do que você colheu em junho, ainda tem mais lá dentro, na dispensa.

– É uma metáfora, Mari. As abelhas, elas têm uma filosofia de vida melhor que os humanos.

– Filosofia? Plantar mandioca para vender e comprar coisas boas para nós e você me agradar que eu dou par você, isso é filosofia, isso é a vida!

– Antropização…

– Também não precisava me xingar, eu estava brincando, eu gosto de dar para você porque você sempre me agrada, quando vai no mercado e vende as mandiocas, sempre traz um presente para mim. Vamos tomar café que tem muita mandioca para vender.

Marilei ficou em casa e aproveitou que o marido foi para a cidade e ia demorar por lá e fez uma limpeza geral, botou roupas na máquina, limpou o banheiro e passou pano por todos os cômodos. Embaixo da cama encontrou um livro que Marisvaldo estava lendo: Introdução à Sociologia. “Esse homem ainda vai endoidecer com esses livros que anda lendo, agora deu de falar coisas que não entendo. Filosofia! E aquele palavrão, antro… não sei o quê”. Abriu o livro e ficou um tempão olhando as palavras diferentes que estavam lá. Elite, Capitalismo, Instituição, Sociedade Estamental, Alteridade, Antropologia… “Antropologia? Foi essa a palavra que o Mari me falou?” Sentou-se na cama e foi ver significado de antropologia. Leu, releu, mas não achou o que queria achar. “Que que isso tem a ver com as abelhas?

– Oi Mari, já estou de volta. Eu trouxe um presente para te agradar!

– O que tem a ver Antropologia com as abelhas?

– Antropização, a palavra é antropização, que é como o ser humano se relaciona com o meio onde vive… Deixa prá lá, depois, mais tarde, eu te agrado com o presente.

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