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‘Delação premiada’, por Abrão Razuk, advogado, militante e escritor sul-mato-grossense

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Abrão Razuk (*)

Primeiro é bom definir o que é delação. Delatar significa, segundo o “Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa”, pg. 930: “denunciar a responsabilidade de alguém ou si mesmo por crime”.

A Lei nº 8.072/90, que dispõe sobre crimes hediondos, em seu art. 8º parágrafo único estabelece o seguinte: “o participante e o associado que denunciar a autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços)”.

Pelo espírito deste artigo é preciso cotejá-lo com o art. 288 do Código Penal assim estatuído: “Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes”; também, com o art. 5º XLIII da Constituição assim definido: “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos por eles responderão os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.

Sabe-se que as figuras delitivas variam de época. Na doutrina penal existem vários requisitos para que o comportamento humano seja passível de punição e a tipificação do crime. A lei penal tem por escopo sua objetividade jurídica. A lei penal no crime de homicídio visa proteger a vida do homem. Dir-se-á que a objetividade jurídica do homicídio é a vida. A lei visa proteger a vida.

O sistema penal brasileiro auxilia-se da filosofia para verificar quais os bens de vida que merecem proteção estatal. Na escala filosófica há incontáveis objetividades jurídicas, tais quais a vida, a liberdade, o patrimônio, a honra, a administração pública, o erário, o meio-ambiente, os direitos difusos etc.

Na Revolução de 64, o fato de a pessoa ser comunista e possuir esta ideologia, era considerado crime contra segurança nacional – crime gravíssimo, hoje, passados os tempos, surgiram outras figuras criminais tidas como graves, merecendo proteção estatal no exercício do jus puniendi, que são os crimes de descaminho, contrabando, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. Então, a repressão varia com o momento histórico da nação. No futuro, cremos que estes bens cedam para a ecologia porque os ataques contra a natureza são imensos e a natureza está se revoltando contra isto, daí furacão, maremoto, Katrina, Rita etc.

Então a objetividade jurídica penal poderá deslocar com intensidade dos tipos legais definidos como crime atrás elencados, para os crimes ambientais, difusos etc. Logo, os bens jurídicos variam com o tempo, que é o que o Prof. Miguel Reale chamava de valor franciscano. O futuro dirá.

O legislador penal quando editou somente o parágrafo único do art. 8º da Lei nº 8.072/90 foi muito inteligente. Passemos a examinar a afirmação. Pela leitura da norma penal verifica-se que a delação premiada tem conotação com mais de três criminosos, ou seja, com associação ou bando na consecução do iter criminis. O delinquente isolado, na sua meta optada, não tipifica e é inviável, juridicamente em sustentar-se a delação premiada.

Sustento que a delação premiada, segundo a lição da teoria das provas, isolada do conjunto probatório, deve ser vista com reservas, pois o juiz togado cotejar o depoimento pronunciado do delator que é um vocábulo pejorativo e antipático, com os demais elementos probatórios, sob pena de julgamento injusto.

Se casar este depoimento com as provas testemunhais, que é a prostituta das provas, com a pericial, documental, confissão etc. então ela passa a ser valiosa com grande instrumento na valoração do conjunto probatório na busca da justiça. Aqui vai a crítica mordaz contra a sentença que se baseia em delação isolada, carta anônima ou escuta telefônica autorizada judicialmente, divorciada dos demais elementos de prova.

Os crimes hediondos previstos em lei que não permitem a progressão de regime ao preso trata-se de heresia jurídica. A pena no Brasil não reeduca nem intimida, pois o sistema penal é falido e destituído de finalidade, assim neste contexto a lei dos crimes hediondos é um monstrengo jurídico desumano e inconstitucional.

A ausência de progressão de regime nos crimes hediondos tem acarretado males para o país, daí rebelião e problemas em todas enxovias e depósitos de presos. Esta lei, em parte, é responsável pelos motins ante o direito natural que o preso tem, seja qual for o delito, de progressão de pena.

Para os crimes graves, como por exemplo latrocínio, sequestro com resultado morte, violência contra menor e o idoso, pistolagem, tráfico de drogas (pena perpétua), a pena deve ser um castigo severo. Para os traficantes o rigor da lei e a legislação deveriam ser modificadas no sentido de aplicar a pena de prisão perpétua. Ensino, trabalho e durante a noite confinamento total. Crime grave a correspondência deve ser o castigo.

Para os crimes de menor gravidade penas alternativas e penas pecuniárias, e substituição de prisão albergue por prisão domiciliar, restrições de direito e prisão domiciliar.

Quando o delator merece este prêmio no termo da lei? É lógico que este prêmio é para o delator que fala a verdade e não para o mentiroso. A expressão da lei “possibilitando seu desmantelamento”. Logo, a lei penal prestigia quem fala a verdade e, sim, ajuda a combater o crime organizado, ou seja, a societas celeris.

Diante da onda avassaladora da criminalidade e o aumento da incidência dos crimes de inteligência logo, o jus puniendi também, deve se aperfeiçoar na produção das provas com amparo nas leis e nos preceitos constitucionais em nome da defesa social na busca da paz e da felicidade entre os seres humanos.Mas,sempre o magistrado deve respeitar o devido processo legal e a

Duração razoável  do processo.

O Desembargador ADALBERTO JOSÉ Q.T. CAMARGO ARANHA, em seu livro “DA PROVA NO PROCESSO PENAL” ensina-nos, verbis:

“No processo criminal, a imputação do co-rréu somente tem valia probatória quando é confirmada por outros elementos de convicção. Não se pode reconhecer como prova plena a imputação isolada de corréu para suporte de um veredicto condenatório, porque seria instituir-se a insegurança no julgamento criminal, com possibilidade de erros judiciários” (RT 410/316).

MITTERMAYER em seu TRATADO DAS PROVAS EM DIREITO CRIMINAL, p. 295.6 renegou força condenatória à delação, afirmando expressamente:

O depoimento do cúmplice apresenta também graves dificuldades. Tem-se visto criminosos que, desesperados por conhecerem que não podem escapar à pena, se esforçam em arrastar outros cidadãos para o abismo em que caem; outros denunciam cúmplices, aliás inocentes, só para afastar a suspeitados dos que realmente tomaram parte no delito, ou para tornar o processo mais complicado ou mais difícil, ou por que esperam obter tratamento menos rigoroso, comprometendo pessoas colocadas em altas condições”. E, arremata o autor do livro precitado, p. 136: “no nosso modesto entender não vale como prova incriminatória. E se outras existem, a condenação será uma resultante destas e não da chamada do co-réu.”

1. Autor do livro. “Crimes Federais”.

2.  Autor do livro:”.   “Enfoques do Direito Civil e Processual Civil.

3.Publicou “Da Penhora”, Editora Saraiva.

4.Dois verbetes na ENCICLOPEDIA SARAIVA DO DIREITO.

Campo-Grande, 30 de setembro de 2021.

(*) Advogado ex-juiz de direito e juiz eleitoral do TRE/MS

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