Reinaldo de Mattos Corrêa (*) –
A falta de um curso de graduação em Antropologia em uma universidade não é apenas uma lacuna disciplinar isolada. Para cursos como Agronomia, Engenharia Agrícola, Engenharia de Aquicultura e Zootecnia — todos de cinco anos, com foco em ciências aplicadas ao meio ambiente e à produção —, essa ausência revela-se um obstáculo invisível que fragiliza a compreensão humana por trás das tecnologias, práticas e impactos sociais dessas áreas.
Agronomia: Falta de Contexto Cultural em Práticas Sustentáveis
A Agronomia, que busca aprimorar a produção de alimentos e a conservação do solo, depende de análises que transcendem a química do solo ou a genética das plantas. Sem a antropologia, os estudantes perdem a capacidade de entender como culturas tradicionais interagem com o ambiente. Ignora-se como o desejo humano molda práticas produtivas. Por exemplo, o cultivo de certas culturas em comunidades indígenas ou rurais não é apenas uma técnica agronômica, mas uma expressão simbólica e econômica. A ausência de antropologia torna os futuros agrônomos menos capazes de negociar conflitos entre modernização e tradição, ou de projetar políticas que considerem a diversidade cultural.
Engenharia Agrícola e Aquicultura: Tecnologia sem Conexão Social
Para cursos como Engenharia Agrícola e Engenharia de Aquicultura, a engenharia sem a antropologia é como “construir pontes sem saber onde elas devem conectar”, como afirma Eduardo Viveiros de Castro em seu estudo sobre a formação antropológica . Uma tecnologia de irrigação ou um projeto de aquicultura pode ser tecnicamente perfeita, mas fracassar se não considerar os hábitos locais, as desigualdades de acesso a recursos ou as narrativas de identidade ligadas à terra e à pesca. A ausência de antropologia, portanto, limita a formação de engenheiros capazes de projetar soluções que se integrem às realidades sociais, reproduzindo assim desigualdades ou resistências.
Zootecnia: Ética e Práticas Tradicionais Ignoradas
Na Zootecnia, a relação entre humanos e animais é central. A antropologia oferece ferramentas para analisar como diferentes culturas veem o uso de animais — desde práticas de criação em comunidades camponesas até dilemas éticos em sistemas industriais. Sem essa perspectiva, os zootecnistas podem subestimar conflitos éticos ou conflitos culturais, como a resistência a métodos de criação intensiva em regiões onde o animal é visto como parte da família. “A ausência de diálogo com a antropologia transforma a formação em uma mera aplicação de técnicas, sem questionar seu impacto na vida humana”, critica o estudo de uma dissertação da UFSM sobre a formação prática em contextos complexos.
Universidade Fragmentada: “Ausência” que Define o Presente
A “ausência” de antropologia, em termos acadêmicos, não é um vazio vazio. É um vazio significativo, que redefine como conhecimento é produzido. Como observa um texto sobre o conceito de “ausência” em contextos culturais , sua falta não é passiva: ela ativa lacunas que outros campos tentam preencher — muitas vezes de forma inadequada. Na universidade, isso significa que cursos como Engenharia Agrícola, por exemplo, carregam o peso de abordar questões sociais que não são seu foco, diluindo sua especialização.
Conclusão: Preço da Especialização Descontextualizada
A ausência de Antropologia não é apenas uma opção curricular, mas uma escolha que limita a formação de profissionais capazes de enxergar além da eficiência técnica. A universidade que isola disciplinas está condenando os cursos a uma visão parcial do mundo. Para os cursos de Agronomia, Engenharias e Zootecnia, isso significa formar especialistas que dominam a ciência, mas ignoram a alma por trás dela.
*Produtor Rural em Mato Grosso do Sul.