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‘Armazém do Vinho’, por Erminio Guedes

(*) Ermínio Guedes –

VERGONHA em Bento Gonçalves (RS), em 2023. Centenas de trabalhadores contratados para colher uva, foram resgatados de regime análogo à escravidão, pelo MPT. Trabalhadores (maioria baianos), eram obrigando a carga de 15h/dia, submetidos a alojamentos nojentos e comida estragada. Eram violentados, torturados com choques elétricos e apanhavam em cárceres privados, mediante qualquer descumprimento de ordens, tal como na escravidão.

Talvez, o Armazém sintetize a degradação humana, homofóbica e violenta, obrigando trabalhadores a comprar “na caderneta”, alimentos, vestuários e demais mantimentos, sempre sobrevalorizados, na dívida descontrolada. Isto mantinha o vínculo no porão do “cativeiro disfarçado”, análogo a “escravidão”. Nesse caso de Bento Gonçalves (RS), as principais agroindústrias da uva, Aurora, Garibaldi e Salton, com milhares de agricultores associados, mostram o horror do ódio, preconceituoso e discriminatório. Grandes empresas que se apequenam, na própria indignidade, ou na mediocridade de seus atos. O princípio fundamental do cooperativismo, que deveria guia-las, na solidariedade econômica e humana, foi rasgado.

O vinho gaúcho vem escalando montanhas e desfilando em prêmios internacionais. Mas não merecem mais isso, porque feriram padrões e boas práticas ESG, riscando objetivos do desenvolvimento sustentável, num conceito de governança incapaz de desempenho socialmente consciente e sustentável. Vinícolas do mercado nacional e internacional, absurdamente acobertarem trabalho escravo, nas suas linhas de produção. Hipócrita a justificativa de contratar safristas externos, por não haver mão de obra local. Se fosse uma relação digna, choveriam ofertas locais, afinal o RS tem enorme contingente de desempregados e subempregados. Na verdade, a real intensão é escravizar mão de obra para baixar custos e acumular, incluindo o sangue na garrafa de vinho vendida a R$ 100, 300, ou mais. Há quem diga que terceirizar serviços sempre se presta a driblar a legislação trabalhista e possibilitar olegalodades, esmagando o trabalhador na acumulação.

O fato é do neoliberalismo emburrecer a sociedade, a tornando egoísta, xenófoba e cruel, racista e rancorosa, preconceituosa e discriminatória. Afinal, como aceitar a atitude intolerante e xenofóbica do Vereador Sandro Fantinel, empresário rural de Caxias do Sul, líder da extrema direita bolsonarista. Só o vídeo pode dar ideia da infâmia reacionária do representante do empresariado local. Sem dúvidas, um vereador tosco, escudeiro da raiva e da truculência, sujando a história regional.  Esqueceu de imigrante pobres e sofridos que chegaram na Serra Gaúcha no Século XIX, trazidos e acolhidos, pelo Estado e pela população gaúcha, quando lhes forneceram tudo para iniciarem com dignidade e chegarem onde estão hoje. Inaceitável, pois, essa intolerância racista a quem, como seus antecessores, procuraram uma oportunidade de trabalho e vida digna. Esse vereador deve ser um ignorante, como quem o elegeu, ou um marginal xenofóbico que nega a história, engana eleitores e suja o nome dos vinhos e o orgulho dos gaúchos. 

A reação é direta e instantânea: impossível as vinícolas não saberem o que ocorria nas linhas colaborativas. Porque não controlavam serviços essências? Não viram o horror em suas escarpas? Onde está a co-responsabilidade? A questão é objetiva: Infâmia ou patifaria bem-vinda? Não se trata de um caso isolado. Há muitos esparramados e despercebidos porque faltou notificar e não virou notícia. Também, não é exclusividade dos grotões, mas também de agroindústrias poderosas, como as de Bento Gonçalves e de fazendas ricas, como daqui, do MS.

Na verdade, safristas existem na agricultura, desde a cana de açúcar, algodão e café. Antes da mecanização plena, o trabalho safrista era intenso. Presenciei a tosquia de ovinos, a doma de cavalos e a colheita de arroz e de trigo. Vi equipes safristas circularem em colheitas bem remuneradas, onde eram tratados com dignidade e respeito pelos contratantes, na fartura alimentar, acomodações e churrasco de encerramento.  Mas, nalguns negócios agrícolas, continuam bem, embora sempre existirão aqueles dispostos a usar os mais infames e antigos métodos para ganhar dinheiro. Não aceitam a produção ética e, se duvidar, se acham empoderados “criadores de empregos” e “donos do mundo”.

De fato, o capitalismo do século XXI terá de se humanizar, sob pena do consumidor bem-informado rejeitar seus produtos, como já está fazendo neste caso da uva gaúcha. Lucrar às custas da miséria de trabalhadores está no repertório dos livros do escritor francês Émile Zola. A ascensão do capitalismo industrial, onde seres humanos eram matéria-prima moída nas linhas de montagem. A fumaça preta simbolizava o progresso capitalista, mesmo as custas de vidas humanas. Semelhança, não é casualidade.

O escandaloso assunto ferve nas redes sociais, maculando uma região incrivelmente turística. Perde o local e a economia do Estado. O turista perde entusiasmo e não guardará saudade das falsas recepções, por mão sujas no sangue escravo. Danos morais coletivos e perda de espaços no mercado é o preço dos absurdos. Os choques usados nos escravizados, precisarão concertar as imagens destruídas na leviandade da violência escravagista.

Pensem nisso!

(*) Consultor/Sustentabilidade

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