Início Tecnologia ‘Agrotóxico, só se for legal’, alertam pesquisadores da Embrapa de Dourados

‘Agrotóxico, só se for legal’, alertam pesquisadores da Embrapa de Dourados

Por Augusto Goulart, Alexandre Roese, Rômulo Scorza Júnior e Crébio Ávila – pesquisadores da Embrapa Agropecuária Oeste

Agrotóxicos, por definição, são os produtos e os agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e também de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, além de substâncias e produtos, empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento. Os principais tipos de agrotóxicos obtidos por processos químicos são: herbicidas, inseticidas, fungicidas, nematicidas e acaricidas.

Área tratada com agrotóxico no Brasil cresceu 7,3% no 1º trimestre de 2020. Os agrotóxicos modernos e eficientes, produzidos de forma legal no Brasil, cumprem seu papel no combate a doenças, pragas e plantas daninhas, contribuindo para os recordes de safra, exportações e produtividade na agricultura. Importante salientar que a produtividade brasileira de grãos, nos últimos 20 anos, teve um aumento de 65%, o que permitiu que a produção de grãos, nesse mesmo período, aumentasse 210%. Grande parte desse pujante desempenho da agricultura brasileira se deve ao uso de tecnologias, incluindo os agrotóxicos, o que tem permitido patamares elevados de produtividade. Sem o uso dos agrotóxicos, as culturas ficam mais suscetíveis às perdas na produtividade. Por exemplo, estima-se que perdas de produtividade da ordem de 10% na cultura da soja, devido ao ataque de pragas, resulte em uma redução de R$ 12 bilhões no PIB do agronegócio e R$ 3,2 bilhões na arrecadação federal, além de redução de 400 mil empregos. (FONTE: IBGE; CONAB; MBAGRO).

Todos os agrotóxicos comercializados no Brasil são aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Dessa maneira, o registro destes produtos no Brasil é um ato complexo e demorado, carecendo de uma análise criteriosa e concordância por parte desses três órgãos. Posteriormente é feito o registro pelo MAPA, conforme previsto no Decreto no. 4.074, de 04 de janeiro de 2002, que regulamenta a Lei de Agrotóxicos. Esses procedimentos tornam a disponibilidade de uso de agrotóxicos no Brasil bastante rigorosa e criteriosa.

O desenvolvimento e registro de um agrotóxico levam, em média, onze anos. Os produtos legalizados são testados ao extremo envolvendo aspectos de eficácia de controle do organismo alvo e de toxicologia ambiental e para animais de sangue quente, como os mamíferos. Os testes definem, por exemplo, as doses recomendadas para uso em cada cultura, de forma a garantir a eficácia dos produtos e o manejo de resistência e, se existente, algum efeito toxicológico e ambiental adverso.

Apesar de todas as vantagens que um agrotóxico produzido no Brasil de forma legal apresenta, há quem insista em descumprir a legislação nacional, optando por utilizar os chamados “agrotóxicos piratas ou ilegais”. Um dos principais motivos alegados para a aquisição desses produtos é o seu baixo custo, sendo que o diferencial de preços pode chegar a 1/5 ou mesmo 1/10 dos valores praticados internamente no mercado legal. O “mercado negro” de agrotóxicos irregulares (piratas e contrabandeados) vem crescendo rapidamente em todo o território nacional.

Em 2019, o uso de agrotóxicos ilegais no Brasil (provenientes de contrabando, falsificação e roubo de produtos) representou 23% do mercado, equivalendo aproximadamente US$ 3,15 bilhões (AGROLINK). Atualmente, cerca de 30% dos agrotóxico agrícolas usados no País são piratas, contrabandeados ou produzidos de forma ilegal (Agrishow).

Existem duas categorias principais dos produtos considerados ilegais ou piratas no Brasil. A primeira inclui os contrabandeados, que são os agrotóxicos que são trazidos de outros países para o Brasil, sem autorização das autoridades. Como esses produtos não foram analisados pelo MAPA, ANVISA e IBAMA, eles não possuem registro para uso no país. A característica mais marcante que facilita o reconhecimento desse produto é o rótulo escrito em língua estrangeira. A segunda categoria é a dos produtos falsificados, os quais são produzidos a partir de produtos regularmente registrados no Brasil, porém, são fraudados por não conterem as concentrações do ingrediente ativo registrado.

Os agrotóxicos “piratas” não são comercializados por empresas legalizadas no Brasil, e sua fabricação e comercialização não obedecem ao Sistema Brasileiro de Registro que é conduzido pelos Ministérios da Agricultura, da Saúde (ANVISA) e do Meio Ambiente (IBAMA). Logo, quem adquire um produto falsificado ou contrabandeado não tem como ter garantias em relação à sua eficácia, efeitos toxicológicos aos seres humanos e efeitos adversos ao meio ambiente. Como não se sabe exatamente qual é o conteúdo dos produtos falsificados, é comum que apresentem ineficácia no controle de doenças, pragas e ervas daninhas, podendo levar ao desenvolvimento de resistência a moléculas. Além disso, podem ainda deixar resíduos no produto final, inviabilizando as exportações brasileiras.

Os riscos advindos da utilização desses produtos ilegais são muitos. O seu uso pode gerar grandes perdas aos agricultores pelo mau funcionamento, causando fitotoxicidade às plantas, falta de controle dos problemas nas lavouras, risco à saúde humana (dos agricultores, de pessoas que habitam ou circulam nos arredores da lavoura e do próprio consumidor, que pode ingerir alimentos com resíduos tóxicos desconhecidos) e contaminação do meio ambiente, tendo em vista que não passaram pelo crivo das autoridades responsáveis pelo registro desses produtos no Brasil. Como esses produtos não são testados e registrados como os originais, são verdadeiras ameaças para o produtor, ambiente e a sociedade. Além disso, a perda de arrecadação de tributos pelo poder público e os riscos no embargo de exportação do agronegócio brasileiro são motivo de grande preocupação. A indústria dos agrotóxicos no Brasil calcula um prejuízo de R$ 260 milhões, todos os anos, em decorrência do uso de agrotóxicos piratas.

Para se ter uma ideia do risco que esses produtos apresentam para o agricultor, veja o que aconteceu no Estado do Paraná, quando foi feita uma apreensão de um determinado produto contrabandeado. O agrotóxico contrabandeado foi analisado e foram encontrados 25 tipos diferentes de ingredientes ativos de inseticidas, fungicidas e herbicidas. Os efeitos econômicos negativos do uso de um agrotóxico ilegal são significativos, pois a eficácia agronômica no controle do organismo alvo pode ser menor que a esperada, não controlando efetivamente a praga, doença ou planta daninha, além de poder causar toxicidade às plantas cultivadas, comprometendo assim a produtividade da lavoura.

Atualmente, estão sendo realizadas campanhas contra os agrotóxicos ilegais no Brasil, tendo como escopo a prevenção ao uso desses produtos. Nesse sentido, as recomendações da Anvisa para aqueles produtores que pretendem fugir dos agrotóxicos irregulares, adquirir somente produtos regulares e devidamente registrados nos órgãos competentes, são as seguintes:

  • Sempre utilize agrotóxicos mediante receita agronômica;
  • Sempre compre agrotóxicos em estabelecimentos destinados a este fim, nunca fora deles;
  • Exija sempre a nota fiscal no ato da compra do produto. Essa será a sua garantia que o produto é regularizado;
  • No ato da compra, verifique alguns dados na embalagem do produto, tal como: número do registro no MAPA, data de validade, número de lote;
  • Verifique também se o nome do produto está bem impresso e pode ser lido facilmente, se o rótulo está escrito em português e legível, se não há rasuras ou alguma informação que tenha sido apagada ou raspada,
  • A bula nunca pode ser uma fotocópia (caso seja fotocópia, a possibilidade de contrabando é muito grande).
  • O produtor deve solicitar as orientações do engenheiro agrônomo para esclarecimentos sobre o produto, sempre que tiver dúvidas;

Por fim, vale lembrar que a produção, o transporte, a compra/venda e a utilização de agrotóxico contrabandeado ou pirateado são crimes de sonegação, contrabando e descaminho. Também estão enquadrados na Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9605, de 12 de fevereiro de 1988); contrabando ou descaminho (art. 334 do Código Penal) e na Lei dos Agrotóxicos (Lei 7.802/89). Quem comete esses crimes está sujeito a penas de reclusão de dois a quatro anos, além de pesadas multas, que podem chegar a R$ 2 milhões, e o mais grave, a destruição de lavouras onde os produtos ilegais foram aplicados pelos agricultores: Dessa forma, pode-se dizer que “o barato pode sair caro”.

NOTA TÉCNICA –  Uma Nota Técnica sobre esse assunto foi divulgada recentemente no Portal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). O documento foi feito com base nas informações desse artigo. Confira no link (https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/insumos-agropecuarios/insumos-agricolas/agrotoxicos/arquivos/copy_of_NOTATCNICA_AGROTXICOS_MAPA.pdf).

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