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A verdade separa poderosos de admiradores – ‘Para que serve o jornalista?’, por Vinicios Araújo

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Vinicios Araújo –

A pergunta que intitula este artigo talvez seja uma das mais ecoadas no Brasil nos últimos anos. Ser jornalista por aqui e muitos outros lugares no mundo, virou sinônimo de ser inimigo do bem comum.

Não porque de fato seja, mas porque a verdade jornalística não conseguiu seguir os mesmos rumos da tecnologia e continua sendo plenamente desconfortável e repreensiva aos que não respeitam os limites da cidadania e do bem coletivo.

Ao contrário do marketing e da publicidade que aproxima, inclui, conforta, a verdade jornalística separa os poderosos de seus admiradores e faz com que cesse a torneira da injustiça e da desigualdade.

Quem não gosta do jornalista, bem provável se conforta com o proselitismo político, massificado por meio da ascensão da internet e a conectividade das redes sociais.

Não gostar do jornalista é até um direito individual de quem, constitucionalmente, pode decidir o que pensa, acredita e defende. O problema é quando essa onda de repúdio ao profissional da notícia se transforma em violência.

Em 2020, ano em que a pandemia do novo coronavírus assolou completamente o País, deixando no retrovisor um cenário de caos e incertezas, a classe jornalística viu os ataques dobrarem comparados ao ano anterior.

Segundo o Relatório da Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa divulgado este ano, nos 12 meses passados mais de 428 profissionais brasileiros da imprensa foram agredidos fisicamente. Em 2019 esse número chegou a 208.

A violência física é apenas um indicador. Pensar nos ataques verbais, no escárnio e na descredibilização dos profissionais do jornalismo faz deste cenário um constrangedor atentado a um dos pilares da democracia brasileira: a liberdade de imprensa.

Não pode ser ignorado o papel fundamental do presidente da República neste contexto. Jair Bolsonaro (sem partido) desde que se ascendeu à corrida ao Planalto faz questão de manifestar sua sórdida visão sobre a imprensa. Bem provável porque este não consegue responder sobre seus atos no mínimo imorais, para não dizer criminosos.

Está cada vez mais comum ver nos noticiários um personagem que deveria estar por trás das câmeras: o jornalista agredido. Muitas vezes ao vivo, para que todos contemplem a humilhação, a vulnerabilidade e o risco a que se expõem esses profissionais.

Quem bate e ofende, faz porque, além de possuírem uma natureza maquiavélica, acreditam também que o jornalista é parcial e transmitirá a notícia de forma tendenciosa e contrária aos princípios e valores por estes preservados — mesmo que tais princípios e valores sejam contrários à autonomia e conservação do estado democrático de direito.

Há também os que matam, mas esses não são, em sua esmagadora maioria, a massa ignorante movida pelo que chamei acima de proselitismo político. O sangue, aqui nesses casos, escorrem nas mãos de poderosos, sejam da política ou do crime organizado.

O que fazem questão de esquecer é que além de uma couraça profissional, atrás do microfone, do bloco de anotação e do gravador, tem um ser humano.

Alguns são pais de crianças brilhantes, outros filhos de trabalhadores que lutaram a vida toda por dignidade e segurança familiar.

Atrás da ferramenta de difusão da notícia também estão os esposos, esposas, namorados e noivos. Estes com data marcada para a próxima viagem ou com financiamento da casa própria, uma realização pessoal, em curso.

Quem acha que o jornalista é apenas uma massa corpórea ambulante se engana ao descobrir que assim como ele que agrediu, o profissional da notícia é tão humano e frágil quanto.

Em meus estudos de graduação, refleti que a grande preocupação do jornalista é satisfazer o anseio por compreensão do que o outro faz que pode me provocar danos.

O homem não vive sozinho. O que seu vizinho faz ou deixa de fazer, pode ser para você um grave atentado do direito e da segurança. Pois saiba que nesses casos, ou até mesmo antes que eles eclodam, estará lá o jornalista, de bloco e caneta na mão, ouvindo seu lado e ouvindo outrem, galgando o percurso de construção de uma verdade que não é absoluta, mas é incontestável.

Porque contra fatos não há argumentos. E é função essencial do jornalista revela-los, seja para seu conforto ou confronto.

A todos os colegas, a minha solidariedade, admiração e desejo de força para esses dias tão sombrios. Feliz Dia do Jornalista a todos.

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