Berenice de Oliveira Machado Souza (*) –
Hoje vou falar das “recaídas” em decorrência do assédio moral, pois a condição de assediado é um estado de vulnerabilidade que pode persistir após o fim da prática, ou novos casos podem acontecer. Os danos psicológicos, como depressão e estresse se manifestam após o fim dessa prática maléfica, e no novo ambiente de trabalho sabe se lá se vai ou não ocorrer outras formas de assédio.
No meu caso sofri uma recaída devastadora (por assédio moral) estando de licença médica e estou em tratamento desde julho de 2021 e com retorno médico a cada três meses, e meu retorno seria para julho de 2025 e, já no final de agosto, sem medicamento então fui procurar saber por que não havia sido marcada o meu retorno médico. Para minha surpresa fui informada que tinha trocado a médica que me atendia e não havia previsão de nova agenda. A princípio entrei em pânico, mas procurei me acalmar, mesmo estando com meu atestado médico prestes a vencer. De qualquer forma, mesmo na incerteza se a profissional médica iria me reavaliar ou não, uma vez que estava sem agenda médica na rede. Em seguida enviei mensagem, via WhatsApp para minha chefe imediata onde estou lotada (mas somente visualizou as msg, sem retorno) para saber sobre eventual retorno ao trabalho ou não, pois não havia tido alta médica, procurei o setor de setor de RH da Secretaria Municipal de Saúde de Dourados-MS. De acordo com a responsável pelo setor RH/Sems, fui orientada a aguardar resposta da Diretora do Departamento onde sou lotada. Diante da morosidade do setor consegui um agendamento com o Secretário Municipal de Saúde, que prontamente me atendeu e relatei acerca do assédio moral sofrido no meu local de trabalho, da falta de medicamento para a continuidade no tratamento médico, também pela falta de agendamento médico.
O Secretário sugeriu que eu me adequasse em outro lugar, que não fosse aquele em que tomei posse porque estava sofrendo assédio moral e que não era bom retornar ao mesmo setor. Indaguei ao Senhor Secretário: – mas é eu que tenho que trocar de setor ou a servidora chefe que assedia? Aliás, não só eu mas uma equipe toda me informa de que no curso da formalização da denúncia, misteriosamente não tem o registro concluído, mas são transferidos para outros setores. Enfim, fui orientada para que aguardasse o agendamento médico e caso houvesse alta médica, que iríamos conversar (eu e o Secretário da pasta) e ver a possiblidade de um outro lugar que não me prejudicasse. Ainda assim no dia seguinte fui informada pelo Setor de RH/Sems que minha chefia imediata já havia me colocado à disposição e que (sic) a CI (Comunicação Interna) da chefia imediata foi feita convocação de uma técnica de enfermagem do concurso para ocupar minha “vaga pura” e que eu ficaria à disposição para outro lugar aonde tiver vaga.
A que ponto chegamos, uma discrepância sem tamanho, sou concursada no cargo de Auxiliar de Enfermagem, e para ocupar a vaga a que sou concursada, somente se eu estiver aposentada ou se eu vier a óbito, ou seja, se houver vacância de cargo. Oportunamente, fui chamada pela responsável do RH/Sems e fui orientada a escolher dentre as 4 vagas existente em várias Unidades de Saúde (Parque do Lago II, Seleta, Joquei Clube ou Ouro Verde), com carga horária de 40 horas. Em seguida, mais 2 vagas, sendo uma vaga para recepção no TFD (Setor de Tratamento Fora do Domicílio) e outra vaga de auxiliar administrativo no setor de Ouvidoria, lembrando que minha função/cargo é de Auxiliar de Enfermagem, acarretando desvio de função e achatamento salarial, além de serem todas bem longe de onde resido e sou lotada. Além do concurso a que me submeti e tomei posse a carga horária é de 30 horas para Auxiliar de Enfermagem. Não estou em readaptação, estou afastada do trabalho por ordem médica, em razão dos efeitos negativos do assédio moral, mas preferem remover o servidor que está sendo prejudicado em todos os sentidos, do que tratar a questão avassaladora propriamente dito. Estou há 41 anos prestando serviço para o Município de Dourados-MS, sempre desenvolvi um bom trabalho, com muita dedicação e amor pelo serviço. Após lutas e persistência realizaram novo agendamento médico, reavaliada pela profissional, prossigo com o afastamento médico, em razão do comprometimento de meu estado de saúde (psíquico, emocional, enfim).
De acordo com os estudos trazem os impactos contínuo do Assédio Moral, conforme segue:
O assédio moral causa:
– Danos à saúde mental e emocional do indivíduo, como depressão, ansiedade e transtorno do pânico, que podem persistir ou agravar-se após o fim da prática.
– Dificuldade de Integração: A vítima pode ter dificuldades em se reintegrar a um novo ambiente de trabalho, sentindo-se insegura, com baixa autoestima e receosa de que o abuso se repita.
– Necessidade de Apoio Profissional: A recuperação do assédio moral geralmente exige acompanhamento psicológico e, por vezes, terapêutico, para que a vítima possa se fortalecer e reconstruir a sua confiança.
– Vulnerabilidade: Após ter sido vítima de assédio, a pessoa pode ficar mais vulnerável a novas formas de abuso, tanto no trabalho quanto na vida pessoal.
– Danos Psíquicos e Físicos: O assédio, quando repetido, leva o trabalhador a um adoecimento físico e psíquico, que pode se agravar e trazer sérias consequências à sua qualidade de vida.
Conforme estudo realizado pela Profª. Eliziane dos Santos – Coordenadora acadêmica do curso de graduação em gestão hospitalar da Faculdade Santa Marcelina, explica como essa relação entre assediador e assediado acontece de forma sutil: “O assédio moral se dá em duas fases: na primeira, a pessoa ainda não tem consciência que a agressão é direcionada exclusivamente a ela, em um segundo momento, a pessoa se percebe como alvo das atitudes maldosas”.
O que causa esses comportamentos abusivos são justamente a falta de discernimento entre poder e autoridade, e que normalmente o/a assediador, ocupa uma posição superior à da vítima no local de trabalho, ou seja, segundo Profª Eliziane: “São pessoas inseguras, mas usam da relação hierárquica para sobressair. Eles têm comportamentos arrogantes e exploram o outro nas relações interpessoais”; “Que o sentimento de inveja e a necessidade de se sentir importante também podem estar presentes no assediador.”
Para Barros (2015), a identificação do assédio moral na administração pública requer a análise de três elementos fundamentais:
- A frequência da conduta;
- A intencionalidade do agente assediador e,
- O impacto negativo na saúde física ou psicológica da vítima.
Para Silva (2017), “o assédio moral na administração pública não é apenas uma afronta ao servidor, mas também um atentado contra a moralidade administrativa”.
Pelo aspecto jurídico e seus fundamentos, há caminhos para o combate ao assédio moral na administração pública fundamentado em diversos dispositivos legais e princípios constitucionais, quais sejam:
– Princípios constitucionais: A dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III) e os valores sociais do trabalho (artigo 1º, IV) são pilares para a proteção contra práticas abusivas.
– Legislação infraconstitucional: A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), apesar de ser aplicada principalmente ao setor privado, serve como parâmetro para a configuração de práticas abusivas no setor público.
– Normas específicas: Algumas legislações estaduais e municipais preveem sanções para casos de assédio moral no serviço público. Por exemplo:
* Lei nº 12.250/2006, do Estado de São Paulo, dispõe sobre medidas de prevenção e punição ao assédio moral no âmbito estadual;
* Lei nº 2769 de 25 de agosto de 2005 da cidade de Dourados-MS, ainda vigente, dispõe sobre a aplicação de penalidade à prática de “assédio moral” nas dependências da administração pública municipal direta, indireta, autarquias e fundações públicas”.
Estamos diante de caso clássico de assédio moral, agravado por motivo torpe e que ainda não foi tratado administrativamente como deveria, fazendo ouvidos moucos, com tratamento frio. A partir das premissas apresentadas ao longo da publicação dos artigos em virtude da ação danosa sofrida por esta escritora, não tem dúvida de que comportamentos como o presente, enquadram-se em ‘atos atentatórios aos princípios da administração pública’, pois ‘violam os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições’, em razão do evidente abuso de poder, desvio de finalidade e malferimento à impessoalidade, ao agir deliberadamente em prejuízo de alguém.
A doutrina tem se debruçado sobre o tema do assédio moral no serviço público, destacando a necessidade de equilíbrio entre o poder hierárquico e o respeito à dignidade do servidor.
Na jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e tribunais regionais têm reconhecido a prática de assédio moral e determinado reparações às vítimas. Destaca-se o seguinte julgado: STJ, RMS 48.944/DF, relator ministro Herman Benjamin: “A prática reiterada de atos abusivos por superior hierárquico, capazes de humilhar servidor público, caracteriza assédio moral, ensejando reparação por danos morais.”
Essa decisão reforça a importância de uma postura ativa da administração pública na prevenção e punição do assédio moral, em consonância com os princípios constitucionais, como compromisso em zelar pela dignidade da pessoa humana.
Em uma análise mais detida, essa prática, s.m.j., paira sobre o pálio do caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 define como ato de improbidade a conduta “que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições”.
Os documentários publicados por certo, servem como base para adoção de medidas cabíveis e necessárias.
(*) Ex-secretária municipal de Saúde, Coordenadora do Programa Municipal deDst/Aids e Hepatites Virais de Dourados, Coordenadora do Fórum dos Trabalhadores em Saúde (2015 a 2018), Presidente do Conselho Municipal de Saúdede Dourados (2013 a início de janeiro de 2019), Servidora pública e graduada em Serviço Social