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A imprensa e a Vila Olímpica Indígena de Dourados

Geraldo Resende (*) –

Entre 2005 e 2007, o Brasil foi confrontado com uma das mais chocantes crises humanitárias em seu próprio território: a morte de dezenas de crianças indígenas por desnutrição, principalmente na Reserva Indígena de Dourados.

A tragédia atingiu principalmente as etnias Guarani Kaiowá e Guarani Nhandeva, e se agravou com fatores como superlotação, falta de saneamento, pobreza extrema, alcoolismo, doenças evitáveis e abandono das políticas públicas de atenção à saúde e alimentação dessas comunidades.

Na época, tive a honra e a responsabilidade de presidir a Comissão Externa da Câmara dos Deputados, criada com a finalidade de investigar essas mortes, tanto em Mato Grosso do Sul quanto em Mato Grosso.

Promovemos audiências públicas, visitamos aldeias, ouvimos lideranças indígenas e agentes de saúde. Apresentei requerimentos ao Ministério da Saúde e ao Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS), cobrando fiscalizações rigorosas. Denunciei a subnotificação de mortes por desnutrição e o silêncio de muitas autoridades diante de um cenário tão cruel e revoltante.

Dessa comissão, nasceram propostas concretas, entre elas a implantação da Vila Olímpica Indígena, um projeto ousado que uniu saúde, educação, cidadania e esporte como formas de transformar a realidade de crianças e jovens indígenas. Em parceria com o então deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), destinamos R$ 700 mil por meio de emendas parlamentares para a construção do complexo. Posteriormente, garanti mais R$ 750 mil junto ao Ministério do Esporte, com contrapartida do Governo do Estado, somando quase R$ 1,4 milhão em investimentos públicos.

A Vila Olímpica ocupa 29 mil metros quadrados na Reserva Indígena de Dourados, e inclui quadra poliesportiva coberta, campo de futebol, pista de atletismo, quadra de vôlei de areia, parque infantil, calçamento, iluminação e prédio administrativo. Tudo pensado para oferecer aos jovens indígenas um espaço de desenvolvimento, convivência, autoestima e valorização cultural.

A inauguração aconteceu em 9 de maio de 2011 (portanto, prestes a completar 14 anos) com a presença do então ministro do Esporte Orlando Silva, do governador André Puccinelli, do prefeito Murilo Zauith, e de importantes lideranças indígenas. Mas, infelizmente, a alegria da inauguração deu lugar à frustração: a gestão do espaço foi negligenciada.

O Governo do Estado alegou impedimentos legais para atuar em área indígena, e a Prefeitura de Dourados, mesmo tendo firmado compromisso, não assumiu sua parte. Diante disso, busquei o apoio da Presidência da República e de ministros para tentar reverter esse abandono.

Hoje, mais de uma década depois, a Vila Olímpica Indígena de Dourados é tratada como um “elefante branco”, como bem destacou o jornalista Edmir Conceição em seu recente artigo publicado na Folha de Dourados.

O artigo é um alerta oportuno e necessário, e reforça o papel fundamental da imprensa, que desde o início teve função corajosa e decisiva na denúncia das mortes de crianças indígenas. Foi graças à cobertura jornalística, aliada ao trabalho de parlamentares comprometidos, que conseguimos mobilizar o país para essa causa.

Era inadmissível que, em pleno século XXI, em um dos maiores polos agropecuários do mundo, em uma terra fértil como poucas, ainda ocorressem mortes por desnutrição e por isso, cumprindo minha missão parlamentar, propus e presidi a Comissão Externa.

Desde então, houve vários avanços, mas o abandono da Vila Olímpica Indígena permanece como uma chaga que demonstra cabalmente o desprezo de setores da sociedade brasileira às causas dos povos indígenas.

É inaceitável que uma obra com tanto potencial social esteja abandonada. Mas afirmo com toda convicção: não vou abandonar essa luta. A Vila Olímpica precisa ser recuperada, revitalizada e funcionar plenamente. Para isso, é necessário o envolvimento dos governos municipal, estadual e federal. Precisamos de um calendário permanente de atividades culturais e esportivas, com profissionais capacitados, estrutura mantida, e sobretudo, com respeito aos sonhos da juventude indígena.

Enquanto eu tiver mandato, voz e disposição, não descansarei até ver a Vila Olímpica Indígena de Dourados cumprindo o seu papel transformador. A dignidade dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul exige mais que promessas: exige ação e respeito.

(*) Deputado federal (PSDB-MS)

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