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Palestras Imortais: Godofredo de Oliveira Neto defende autonomia da literatura no último Chá Acadêmico da ASL em 2025

Por Edson Moraes –

“O que acontece quando um escritor decide comprar histórias? E o que surge quando a narradora resolve inventar metade delas”? Com estes questionamentos, Godofredo de Oliveira Neto ergue um contraponto dos  mais instigantes ao comentar “A Ficcionista: Sonhos e Fantasias de Uma Narradora”, seu novo romance: “Parto de uma ideia que me acompanha há muitos anos: a autonomia da literatura, essa arte que trabalha com a língua antes mesmo de ela ser escrita”.

Foi na esteira de conceitos como este que o romancista, professor universitário e ocupante da cadeira 35 da Academia Brasileira de Letras (ABL) conduziu na quinta-feira, 27, a palestra “Língua e Literatura de Expressão Portuguesa: Identidades e Encontros”, na última edição do ano do Chá Acadêmico, realizado pela Academia Sul-Mato-Grossense de Letras (ASL). A palestra foi a 11ª do Projeto “ABL na ASL: Palestras Imortais” e é fruto de parceria com a Secretaria Estadual de Turismo, Esporte e Cultura (Setesc) e Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FCMS). 

Dezenas de acadêmicos da ASL, entre os quais o seu presidente, Henrique de Medeiros, estudantes, professores e intelectuais prestigiaram a competente e comunicativa abordagem do palestrante. “A literatura não retrata o real, mas compete com o real”, assinalou Godofredo, depois de discorrer sobre diferentes ciclos e episódios da literatura e das artes, entre os quais a Semana de 1922.

Para ele, a identidade cultural não prescinde da autonomia literária. “A literatura atual – com boas intenções, porque contribui para um Brasil mais justo e democrático – não pode perder de vista a autonomia da arte”, enfatizou. “A literatura não é um panfleto, um folhetim ou um documento sociológico. Essas causas podem vir com os autores de qualidade, mas não é este o principal objetivo da arte. Estou pugnando por esta visão. E a arte literária ainda possui a característica de trabalhar com a língua. É diferente da pintura, da música, por exemplo”, emendou.

OLHAR ABRANGENTE – Para Godofredo, a iniciativa da ASL é a revelação, acima de tudo, do comprometimento cultural e do olhar da mais ampla abrangência com que o Estado focaliza os desafios da arte, no âmbito literário. “É preciso ter compromisso, desamarrar tudo o que prende as manifestações culturais e artísticas”, advogou. “A procura de identidade e de conhecimento impõe a ousadia de descobrir e criar, sendo essencial, portanto, a autonomia”.

Henrique Medeiros realçou a presença de figuras de proa no arco de autores nacionais neste projeto e a importância de realizar palestras que, inclusive,  provoquem a sociedade, como um todo. “É para tentar aproximar o público e a leitura por meio de instrumentos como é esta academia. É abrir totalmente as portas a um trabalho que represente realmente mudança, para que a gente possa estar contribuindo com a evolução do pensamento, da autocrítica, fortalecendo a consciência cultural do Estado”. 

O presidente da ASL ressaltou o lastro decisivo na parceria com a Setesc e a Fundação de Cultura. (FCMS), “que, à exceção de outros governos, tiveram visão, entenderam a importância da literatura, para que não se fique somente com investimentos em música e na área de shows”. Medeiros pontuou: “A literatura em si – que é o pensamento, é a palavra que está atrás de tudo – precisa de fomento. Tem o cinema mudo, mas é preciso ter um roteiro, que é a palavra. Têm música, a letra, a construção musical, mas se está levando mensagens”, completou.  

Além do Projeto Palestras Imortais com os acadêmicos da ABL, Medeiros mencionou a reverência da ASL aos escritores saudosos na Roda Acadêmica, que funciona de alternadamente com o Chá, e ressaltou a dimensão de pessoas e instituições na construção da cultura regional: “É essencial que agradecer à Universidade Federal por esse trabalho com a música clássica e suas vertentes. Abre um espaço à música de concerto e ao estudo da música erudita. E agradecer à Confraria Sociartista, que ajuda a valorizar nossos artistas. É a literocultura trabalhando pelo Mato Grosso do Sul”. 

Palestras Imortais: Godofredo de Oliveira Neto defende autonomia da literatura no último Chá Acadêmico da ASL em 2025
Acadêmicos da ASL ladeiam o escritor Godofredo de Oliveira Neto

PARCERIA – Eduardo Mendes Pinto, presidente da FCMS, sublinhou o alcance do projeto e a participação na iniciativa da ASL: “O resultado se define com uma palavra: sensacional! Temos já dois anos de parceria e vemos um crescimento gradativo do interesse das pessoas e a unificação da Academia com a Fundação de Cultura”, comentou. “E isto tem exemplo nos festivais. A ASL faz parte do Festival de Inverno de Bonito, toma corpo no Quebra Torto Literário do Festival América do Sul e agora, na Bienal do Livro, levando um grande público”.

Para 2026 Eduardo prevê novos avanços, um deles no programa dos 10 anos do Festival de Bonito (Flib) e outro na Bienal de São Paulo, provavelmente com uma apresentação da ASL. “Temos que pensar em formas de popularizar cada vez mais estas realizações, pois a sociedade é informada, é chamada, encontra motivações”, enfatizou. O estímulo à leitura também foi pontuado por ele, ao dizer que esta é uma prioridade.

“A gente tem que pensar a cultura de forma antropológica, quando se pensa em artesanato, em povos originários e na própria literatura, nas mais amplas possibilidades culturais”, defendeu. O Chá Acadêmico foi coroado com as apresentações do Grupo Opus Vivare, da UFMS (músico com Evandro Dotto e intérpretes Bianca Danzi e Mara Brandão) e da Confraria SociArtista, com os artistas visuais Luciana Rondon e Walter Lambert.

Um outro momento de emoção no Cá Acadêmico foi na abertura, quando a ASL prestou no telão do auditório uma homenagem póstuma ao artista plástico e produtor cultural Pedro Guilherme, que morreu dia 20 de novembro passado, aos 58 anos, após um infarto fulminante. Além de esculturas emblemáticas focalizando a natureza, idealizou e levou adiante a criação da Confraria Sociartista, um dos movimentos culturais de maior importância no cenário cultural sul-mato-grossense. 


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