Em homenagem ao poeta Manoel de Barros, (neste 13 de novembro, quando completa 11 anos de seu falecimento), escritores, professores e pesquisadores debaterem a importância de sua literatura no cenário das universidades brasileiras.
O evento transmitido ao vivo, teve inicio à tarde de ontem, encerrando somente à noite, com mais de oito horas oficina e aflorando sobre a vida simples e a eternidade do pensamento do poeta, que transformou a escrita e a estética da poética nacional.
O evento, contou com cerca de 200 pessoas entre escritores, professores e pesquisadores e com a participação presencial e remota de acadêmicos e apreciadores da poesia de Manoel de Barros. Numa conferência entre especialistas, além de uma imersão sobre a obra e o entendimento acerca do pensamento do poeta, realçaram as particularidades de sua vida marcada pela simplicidade e vocabulário neologista.
O evento contou com cerca de 200 pessoas entre escritores, professores e pesquisadores e com a participação presencial e remota de acadêmicos e apreciadores da poesia de Manoel de Barros
Entre os seus inúmeros versos escreveu que “na ponta do meu lápis só tem nascimento”,
ponto de partida que propiciou uma forte reflexão sobre a “simplicidade erudita” e a “potência do pensamento” de Manoel de Barros, segundo o professor de Literatura e Museologia Elton Luiz Leite de Souza, mestre em Filosofia e Comunicação e Cultura pelas Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade do Rio ( UNIRIO) e um dos principais pesquisadores sobre o escritor, que cultivava a infância e enxergava além do óbvio.
A oficina sobre Manoel de Barros, foi realizada no Auditório Paulo Freire, da UNIRIO,
iniciando na tarde de quarta-feira (12) e avançando pela noite, com especialistas da UFRJ, UNIRIO, USP, UFGD e Universidade do Pama. De Mato Grosso do Sul, participaram o jornalista e escritor Bosco Martins, autor do livro “Diálogos do Ócio” (Editora UFMS) e as gestoras do museu Casa-Quintal Manoel de Barros, Valéria Arruda e Raylla Mirela.

Com o foco nas particularidades da vida cotidiana do poeta, cada participante discorreu cerca de 20 minutos, sobre o homenageado.
O professor Elton Luiz Leite de Souza, também um dos oraganizadores do evento, já publicou “Manoel de Barros a poética do deslimite” que trás um manuscrito do poeta sobre sua obra e o livro “POESIA PODE SER QUE SEJA FAZER OUTRO MUNDO, uma homenagem ao centenário de Manoel de Barros” e destacou o conteúdo do livro “Diálogos do Ócio”, definindo a publicação como uma obra “belíssima” e “importante” por reunir os principais fatos não só no campo literário, mas também da personalidade do poeta. “A obra do Bosco transcende o formato de uma biografia convencional. Trata-se, antes, do mais revelador estudo já realizado sobre o universo poético de Manoel de Barros — um mergulho em sua linguagem, suas paisagens e suas invenções e que nos leva a compreender melhor sua obra poética,” dissertou o mestre na apresentacão.

A participação de Bosco Martins e das gestoras do Museu Casa-Quintal, Valéria e Raylla proporcionou um ambiente emotivo ao evento, encantando diversos participantes on-line que respondiam com emojis (coração e palmas) no video do telão, exposto no auditório da UNIRIO. Bosco usou seu tempo para destacar a presença da esposa Stella Barros. Segundo ele “uma mulher decidida (como a filha Martha) e que foi inspiração do poeta e o esteio da família pois era uma mulher verdadeira, generosa e que impulsionou o marido, os filhos e netos, até o fim.”
Martins, emocionou os presentes ao ler um trecho de seu livro, denominado “Nequinho”, (apelido carinhoso dado ao poeta, pelos amigos e familiares) em que a esposa e cúmplice da disciplinada rotina de lapidação de palavras, fala do lado humano de Manoel de Barros,
que abominava a classicocracia.
Em outro trecho do livro Bosco diz que: “Stella foi a alma gêmea do poeta. Ele encontrou nela a companheira de todas as horas. Na alegria e na tristeza – como se prometeram no casório. Conseguiram ser, um amor profundo e sonhado em todos os dias. Stella teve papel e percepção não só no dia a dia da casa, mas também na poesia dele.” No livro “Dialogos do Ócio, um inventário de amizade do autor e o poeta Manoel de Barros”, outra passsagem destaca a importancia dela em sua literatura, quando Manoel revela ao autor: “Já sofri pra escrever…já padeci. Porque, para eu entregar livro pra uma editora, eu só entrego depois que acho que está realmente pronto, e ainda boto para Stella ver. Se ela acha ruim, aponta para meu escritório, que fica no segundo andar, e diz:
Pode subir, vai trabalhar mais. Assim não está bom. Isso é verdade. Nós somos casados há quase 60 anos, de forma que ela conhece o que escrevo, até onde eu posso chegar. Ás vezes, ela fala assim: Ainda não esta você, ainda não chegou a ser Manoel. Ela me conhece mais do que eu, e entende disso…aí eu subo… boto a mão na massa e trabalho até ser Manoel. (Trecho, Entrevistas como ninguém fez, capitulo II, pg 42).
Valéria Aruda do Museu Casa-Quintal também falou da força e importância de dona Stella, companheira de Manoel de Barros por 64 anos e que morreu aos 99 anos, na véspera do aniversário do poeta, que completaria 103 no dia seguinte, dia 19 de dezembro.

Dona Stella estava em casa, na Rua Piratininga, no bairro Jardim dos Estados onde hoje é o Museu Casa-Quintal prestes a completar 100 anos, comemorados em abril de 2021. Acima de tudo eles tinham respeito e admiração. “Ele tinha uma admiração muito grande por ela. Na casa, ela tinha voz, ela mandava e isso que dava liberdade para ele. Ela sempre foi apaixonada pelo homem Manoel e ele apaixonado por ela”, disse Valéria. Mesmo após a despedida do marido, Stella permaneceu na casa onde o casal viveu, em Campo Grande, junto do jardim de Manoel.
Manoel de Barros desbravava o universo das miudezas não só na poesia, mas também no dia a dia, com a delicadeza, com a timidez, sensibilidade e paciência como o caminhar do caramujo, tinha um rotina lúdica e essa particularidade da vida pessoal pode ser sentida por quem visita o museu Casa Quintal, segundo Valéria Arruda, que faz parte da Associação de Amigos do Poeta Manoel de Barros e passou a ser uma da voluntárias na manutenção e preservação do local.
O entendimento que os especialistas convergem é de que Manoel de Barros adotou uma linguagem ecológica e correlacionada a todas as ciências. O elemento primitivo e a rejeição à palavra acostumada reforça a tese dos especialistas sobre a simplicidade erudita de Manoel de Barros, que primava pelo aprendizado do desaprender e buscava a palavra não dita para solapar o lugar comum, como destacou o pesquisador Écio Pisetta.
“A poesia de Manoel de Barros é capaz de lançar luz sobre as coisas que a gente não vê, como a Amazônia, o Pantanal”, destacou o professor Marcos Aurêlio Marques, que falou a similaridade de Manoel de Barros com o poeta Thiago de Mello na forma de enxergar a natureza, sua diversidade e pluralidade.
Manoel de Barros sempre cultivou a vida simples e dizia que “liberdade e poesia a gente aprende na infância”. Daí a infância como fio condutor de sua obra, rejeitando a ”velhez” (neologismo que não significa velhice). O poeta levava uma vida sossegada. O professor Nilton dos Anjos, que ressalta desconhecimento sobre a obra de Manoel de Barros em profundidade, mas é percptível que Manoel de Barros pensava como Fernando Pessoa de que não é fácil ser simples, mas é muito mais interessante. “A Manoel de Barros é um santo remédio e a dependência dele não causa nenhuma dano”.
Para Elton Leite, “a potência do pensamento” de Manoel de Barros não se restringe apenas à produção literária, quando se vê o lado humano, o ser simples e seu modo de vida e a pecha de bocó não mudaria seu conceito de que sejamos bobos, como dizia Clarice Lispector. A conferência em homenagem a Manoel de Barros busca realçar a essênca do ser humano e se ter uma imagem diferente ou “descomparamento” segundo o neologismo do poeta, para quem o comparamento deveria ser comunhão. “Manoel de Barros não era exatamente um otimista e nem pessimista”.
O pequisador trouxe à lembrança episódio em que conseguiu se comunicar com Manoel de Barros sobre uma publicação que precisaria ter a autorização dele e só conseguiu apó ser aconselhado pela filha do poeta, Martha Barros, a enviar uma carta, escrita à mão. O poeta não atendia telefone e não gostava de receber cartas datilografadas. Não significa, porém, que vivesse recluso, pelo contrário, estava sempre em trasformação, ou no estado “devir”, explorando a infância e a natureza, usando a linguagem para criar um fluxo de invenção e criação. Ele desinventava o mundo e as coisas, aproximando-as da inocência e da maravilha infantil, num processo constante de reinvenção e se expressava buscando “criançamento” nas palavras.

