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JBS exportou carne de fazendas ilegais da Amazônia para Europa, diz relatório

Agência Pública

Relatório da Human Rights Watch ainda aponta desmatamento, violência e falhas em fiscalização no Pará

Por Duda Sousa | Edição: Thiago Domenici –

A JBS, maior produtora de carne do mundo, pode ter exportado para a União Europeia carne bovina e couro produzidos com gado proveniente de fazendas ilegais no Pará, mesmo estado que vai receber líderes mundiais em Belém para debater soluções contra a crise climática durante a COP30 no próximo mês.

Em relatório divulgado nesta quarta-feira (15) a organização Human Rights Watch (HRW) aponta que a pecuária ilegal tem devastado a floresta amazônica e violado os direitos de pequenos agricultores e comunidades indígenas na região, como a Terra Indígena Cachoeira Seca, lar do povo Arara, e o Projeto de Desenvolvimento Sustentável Terra Nossa. 

Mapa mostra a perda de cobertura florestal em 24 anos na região do PDS Terra Nossa e TI Cachoeira Seca
Mapa mostra a perda de cobertura florestal em 24 anos na região do PDS Terra Nossa e TI Cachoeira Seca

Segundo o relatório, ao menos 45% da área do assentamento Terra Nossa já havia sido convertida em pasto em 2023, e 78,5% estava ocupada ilegalmente. Moradores relatam episódios de violência, incêndios criminosos e ameaças. “A gente tinha um sítio muito bonito, de onde tirava nosso sustento”, contou uma moradora à HRW.

Em entrevista para a Agência Pública, a cientista e ambientalista Karin Brüning, afirma que o avanço das fazendas ilegais representa não apenas uma crise ambiental, mas também humanitária. “A substituição da floresta por pasto reduz drasticamente a biodiversidade, altera o ciclo das águas e contribui para o aumento das emissões de carbono”. Segundo ela, as invasões e a abertura de novos pastos empurram povos indígenas e pequenos agricultores, gerando conflitos e destruindo modos de vida que dependem da floresta.

Por meio da análise de guias de trânsito animal emitidas pelo governo do estado do Pará, a HRW afirma ter identificado cinco casos em que fazendas ilegais no Terra Nossa e na TI Cachoeira Seca forneceram gado para fazendas fora dessas áreas protegidas e, posteriormente, essas fazendas venderam gado para frigoríficos da JBS. As fazendas de gado investigadas nesses territórios são ilegais segundo a legislação federal brasileira.

A GTA é exigida por lei para cada transporte de gado, mas não é um documento público. Nela devem constar origem e destino do animal, nome, CNPJ ou CPF do vendedor e do comprador do lote bovino, controle de doenças, quantidade e faixa etária e se a movimentação tem como finalidade a criação, a engorda ou o abate.

Questionada pela HRW, a JBS afirmou que monitora as fazendas de seus fornecedores diretos para verificar se eles cumprem sua política de compras. A empresa também afirmou que, a partir de 1º de janeiro de 2026, será obrigatório que os fornecedores diretos disponibilizem informações sobre seus fornecedores.

JBS exportou carne de fazendas ilegais da Amazônia para Europa, diz relatório

Gado sem rastreabilidade e desafios

A pesquisa aponta que, a ausência de rastreabilidade completa do gado no Brasil permite que produtos contaminados por desmatamento e violações de direitos humanos cheguem até o mercado europeu. Embora o novo Regulamento da União Europeia sobre Produtos Livres de Desmatamento (EUDR) exija, a partir de 2026, a identificação de todas as fazendas onde o gado foi criado, o sistema brasileiro ainda não oferece essa transparência. Assim, carnes e couros processados em frigoríficos da JBS localizados em municípios como Marabá (PA), Colíder (MT) e Andradina (SP) podem ter sido exportados para países como Itália, Bélgica, França e Alemanha, burlando as exigências ambientais e de direitos humanos impostas pela legislação europeia.

Karin Brüning explica que os desafios para uma pecuária sustentável são vastos e envolvem desde a fiscalização até a mudança de modelo econômico. “A rastreabilidade e o controle de origem dependem de uma estrutura estatal eficiente, o que hoje é insuficiente. Os frigoríficos controlam seus fornecedores diretos, mas o problema está nos intermediários, onde se perde a transparência. Enquanto o mercado continuar premiando a rentabilidade de curto prazo, a formalização fundiária e a sustentabilidade seguirão em segundo plano”.

Para ela, o combate à devastação exige não apenas mais fiscalização, mas cooperação internacional. “A União Europeia tem papel essencial ao endurecer regras e exigir auditoria das cadeias produtivas. Pressão e transparência precisam andar juntas, e países importadores devem assumir corresponsabilidade por produtos que chegam ao mercado com origem ilegal. Isso inclui sanções comerciais, incentivo a práticas sustentáveis e apoio técnico a pequenos produtores”, destaca a ambientalista.

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