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Picadinha: ‘É confisco disfarçado de causa quilombola’, diz advogado sobre disputa por terras

Juliel Batista –

A disputa por terras na região da Picadinha, localizada no município de Dourados, segue judicializada e envolve tensões históricas e versões conflitantes sobre a origem e o destino de um território de quase 3.800 hectares. A área em questão é reivindicada por descendentes da comunidade quilombola formada pela família do senhor Dezidério Felipe de Oliveira, considerado um dos primeiros moradores da região.

Segundo relatos de moradores quilombolas, após a morte de Dezidério, o então advogado da família — que teria assumido a condução da partilha — se aproveitou do desconhecimento legal dos herdeiros, muitos dos quais eram analfabetos, para ficar com a maior parte das terras. “Cerca de três quartos do território acabou ficando com esse advogado”, alegam lideranças da comunidade, afirmando ainda que o profissional teria, posteriormente, vendido as áreas que haviam sido doadas a Dezidério pelo Governo do Estado de Mato Grosso. Essa versão é discutida atualmente na Justiça e no âmbito do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

A reportagem da Folha de Dourados ouviu o advogado Cícero Costa, representante de algumas das famílias que ocupam a região, mas que não se autodeclaram quilombolas. Ele refuta as acusações feitas contra o advogado da época e afirma que a propriedade das terras foi legitimamente adquirida. “Sem nenhuma pertinência a alegação de que os herdeiros de Dezidério foram enganados”, afirmou.

Cícero Costa sustenta que as terras “foram alienadas pelo Governo do Estado de Mato Grosso ao cidadão Dezidério Felipe de Oliveira” e que, desde então, estão regularizadas.

“Sem nenhuma pertinência a alegação de que os herdeiros de Dezidério foram enganados”, afirmou.

Segundo ele, todas as famílias que residem na Picadinha atualmente são proprietárias com documentação registrada em cartório. “Quilombolas são exclusivamente os descendentes de Dezidério, em torno de 45 pessoas autodeclaradas. Todos que residem lá são proprietários, com posse e domínio registrados”, pontua.

A entrevista a seguir trata de pontos como o histórico das terras, o andamento judicial dos conflitos, a posição do Incra e a ausência de diálogo entre as partes envolvidas — além da visão do entrevistado sobre uma possível solução para encerrar a disputa que, há anos, divide vizinhos e atravessa gerações na comunidade.

Leia a seguir, a entrevista.

Folha de Dourados – Recentemente, muito tem se falado sobre a regularização fundiária da Comunidade Quilombola da Picadinha. No entanto, moradores antigos alegam que, após a morte do senhor Dezidério, o então advogado da família se aproveitou da situação, já que muitos eram analfabetos, e acabou ficando com a maior parte das terras que deveriam ter sido destinadas à comunidade. O que o senhor pode comentar sobre essa alegação?

Cícero Costa – O artigo 68 da ADCT preconiza que “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.” Infere-se do texto que somente as terras devolutas que estejam ocupando é reconhecida a propriedade definitiva aos remanescentes das comunidades dos quilombos.

Logo, sem nenhuma pertinência a alegação de que os herdeiros de Dezidério foram enganados pelo advogado que atuou na partilha das terras da Fazenda Cabeceira do São Domingos que a ele pertenciam. As terras da Fazenda Cabeceira do São Domingos eram devolutas até o momento em que foram adquiridas por Dezidério ao Governo do Estado de Mato Grosso.

“As terras da Fazenda Cabeceira do São Domingos eram devolutas até o momento em que foram adquiridas por Dezidério ao Governo do Estado de Mato Grosso.”

Atualmente, quantas famílias residem na região da Picadinha? Entre elas, quantas são quilombolas e quantas são ocupantes ou proprietárias de terras na localidade?

Residem na Picadinha em torno de 351 pessoas. Quilombolas são exclusivamente os descendentes de Dezidério, em torno de 45 pessoas auto declaradas quilombolas. Todos, sem exceção, que residem na Picadinha, são proprietárias. Possuem posse e domínio registrado no Cartório de Imóveis de Dourados (MS).

“Todas famílias, sem exceção, que residem na Picadinha, são proprietárias”

Em relação ao processo de regularização da terra, em que instância se encontra atualmente? Como está o andamento dessa ação?

Não há processo de regularização da terra na Picadinha. Todas as terras na Picadinha que estão envolvidas na questão quilombolas são regularizadas. As terras com origem no lote Cabeceira do São Domingos estão regularizadas desde a origem em que foram alienadas pelo Governo do Estado de Mato Grosso ao cidadão Dezidério Felipe de Oliveira. Há, portanto, um confisco de terras particulares dissimulado de questão quilombola.

“Há, portanto, um confisco de terras particulares dissimulado de questão quilombola”

Sobre os processos judiciais que envolvem o território da Picadinha, há alguma tentativa de negociação entre os moradores não quilombolas e os integrantes da comunidade remanescente? Caso não exista esse diálogo, qual é a sua análise sobre os possíveis desdobramentos?

Não há negociação de qualquer espécie. Toda a questão está judicializada. O que se espera, é que o Poder Judiciário se dê conta da ilegalidade administrativa que representa a questão quilombola na Picadinha e decida pelo respeito à ordem pública.

“O que se espera, é que o Poder Judiciário se dê conta da ilegalidade administrativa(…)”

Qual é, atualmente, a extensão total do território identificado como pertencente ao Quilombo da Picadinha? E dentro dessa área, qual porção está sendo questionada judicial ou administrativamente?

O lote Cabeceira do São Domingos regularizadas desde a origem em que foram alienadas pelo Governo do Estado de Mato Grosso ao cidadão Dezidério Felipe de Oliveira, possui uma área de 3.748 hectares. Esta é a área de terras dada pelo estudo do INCRA como Quilombola. Porém, o próprio INCRA alterou a área originária de 3.748 hectares para 1.6966,5718 ha. Qual é a explicação?? Ilegalidade do INCRA praticada contra as terras particulares oriundas do lote Cabeceira do São Domingos que pertenceu regularizado em nome de Dezidério.

“há Ilegalidade do INCRA praticada contra as terras particulares oriundas do lote Cabeceira do São Domingos que pertenceu regularizado em nome de Dezidério”

Considerando os conflitos e as divergências em torno da posse da terra, na sua visão, qual seria a melhor solução para encerrar essa disputa de forma justa e pacífica?

A melhor solução é a Justiça fazer que o INCRA respeite a ordem pública e o interesse público defendendo o ordenamento jurídico no que toca à propriedade, o processo legal, a segurança jurídica.

“A melhor solução é a Justiça fazer que o INCRA respeite a ordem pública”

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