José Henrique Marques –
Na primeira metade da década de 1990, o diretor do Colégio Objetivo, o professor e apresentador de TV, Benê Cantelli, criou em sua escola o Programa Teen, que fez muito sucesso em Dourados. Como empresário do setor educacional, Benê tinha consciência da importância do marketing em seu negócio, ainda mais naqueles tempos de muita concorrência entre cursinhos pré-vestibulares. Investia pesado em propaganda, principalmente na TV Caiuás e no jornal O Progresso.
Marcou época na região. Milhares de profissionais liberais e empresários douradenses passaram pelas salas de aulas em seus dois colégios: na Avenida Marcelino Pires e na Rua Hilda Bergo Duarte, onde aplicava o sistema de ensino do Grupo Objetivo – lendário colégio paulistano, que da Avenida Paulista, 900, se expandiu para o Brasil e cujo fundador, o médico e empresário João Carlos Di Gênio (falecido no ano passado) tinha familiares em Dourados e Caarapó.
Benê Cantelli valia-se do apoio ao esporte (inclusive foi grande incentivador do jogo de Xadrez) e do Programa Teen, veiculado na hora do almoço na TV Caiuás (hoje RIT), como ferramentas de marketing. Visionário, ungiu entre a multidão de alunos e alunas uma jovem secundarista para ser a repórter do Teen: Maria Imaculada Nogueira – hoje a consagrada jornalista Lia Nogueira e mandatária como deputada estadual.
Com razoável estrutura, a equipe Teen, com a repórter Maria Imaculada e o cinegrafista João Ramão Rodrigues à frente, passaram a ser vistos em todos os cantos da cidade, cobrindo pautas de toda a ordem, de dia e à noite. As reportagens editadas e depois levadas ao ar pela TV Caiuás começaram a chamar a atenção da imprensa, do Sindicato dos Jornalistas na Região da Grande Dourados (Sinjorgran), na época presidido por mim e em fase aguda de regularização da categoria, enfim dos telespectadores da emissora do ex-prefeito José Elias Moreira. Foi um sucesso.
O jornalista Fábio Dorta é um profissional perspicaz e muito bem humorado. A história dele no jornalismo é intrínseca à TV Caiuás/RIT, onde começou a trabalhar muito jovem, em meados de 1980, e por lá está até hoje e há muitas décadas na direção de Jornalismo.
Atento ao mercado, precisando recompor o Departamento de Jornalismo e de olho no Programa Teen, no final de 1994, Fabio Dorta e seu chefe de reportagem, Antônio Coca, resolveram entrevistar a repórter do “programa do Benê”. Como era desinibida na frente das câmeras, trabalhadora e humilde, poderia dar certo.
Na entrevista, Fabio Dorta logo perguntou: Como é seu nome completo, minha filha. “Maria Imaculada Nogueira” – respondeu a repórter teen. Embora também jovem, mas já experiente, Fabio Dorta sabia que um nome profissional/artístico que soasse bem nos ouvidos dos ouvintes era meio caminho andado para gente talentosa emplacar uma boa carreira profissional na imprensa, principalmente no rádio e na televisão.
“Maria Imaculada”, não dava, na opinião do Caixote, como é zoado pelos amigos da lida, principalmente dos meios esportivos. A propósito: Maria das Graças Penna Burgos ficou conhecida como Gal Costa.
Pouco tempo depois, do nada, na mente de Fabio Dorta surgiu o nome que consagraria a revelação de Benê Cantelli: Lia Nogueira, que gostou da sugestão e adotou o nome profissional. O resto é história.

Fabio Dorta é um jornalista completo, um craque, é considerado um dos melhores narradores esportivos do rádio sul-mato-grossense. Não à toa é membro de um clã da imprensa douradense: o pai, Waldemar, foi braço direito de Jorge Antônio Salomão, na Rádio Clube, e a filha, Fabiane, também é jornalista com muito destaque. Fabinho não é o pai da Maria Imaculada, mas da “Lia Nogueira” é, sim.
Lia Nogueira ficou na emissora até 1997, quando foi contratada pela TV Morena. Depois voltou ao comando de Fábio Dorta na emissora que, depois de vendida por Zé Elias, teve outras denominações até a estabilização com o Grupo RIT.

Do início da carreira até a atualidade, Lia Nogueira foi jornalista provisionada, fez faculdade de Jornalismo e de Direito, na Unigran, e seu último vínculo profissional foi na sucursal da TV MS (Record), de onde “a pedido” de déspotas de plantão (entre eles, pelo menos dois jornalistas) foi desligada em 2022.
Pelas minhas recordações, foi através do Programa Teen e como presidente do Sinjorgran que soube da existência da “Preta”, o apelido de Lia Nogueira entre familiares e amigos de infância. Tempos depois, na administração do prefeito Laerte Tetila (2001-2008) conheci a mãe dela, Elza Pedroso Nogueira, de quem, com certeza, puxou. Crítica, combativa, determinada e idealista, foi a primeira coordenadora do Centro de Atendimento à Pessoa com Deficiência Dorcelina Folador e membro de conselhos municipais.
O tempo passou, cada um cuidando da vida, da sobrevivência, até que 23 de junho de 2017 nossa história convergiu, nas lides do jornalismo: eu pela Folha de Dourados e Lia pela TV MS. Na tarde daquela sexta-feira estávamos no Aeroporto Regional de Dourados Francisco de Matos Pereira, esperando o pouso do avião em que estavam embarcados o então governador Reinaldo Azambuja, o poderoso secretário de Governo Sergio de Paula e o deputado federal Geraldo Resende.
Com a devida vênia, registro um furo de reportagem da Folha. Com o atraso do avião do Governo do Estado, a aeronave da Azul, vinda de Campinas-SP, pousou minutos antes trazendo entre os passageiros, Eleandro Passaia. Pivô e alcaguete da Operação Uragano, usou suas habilidades de jornalista para gravar políticos, empresários e alguns que tais da imprensa, revelando a podridão do submundo da política douradense.
Com certeza, Passaia, depois de tanto aprontar em Dourados, não esperava encontrar a imprensa e lideranças políticas no aeroporto, como os deputados Zé Teixeira e Marçal Filho, o ex-deputado Valdenir Machado (com quem eu estava de carona) e vereadores.
De óculos escuros e de boné, tentou passar desapercebido no meio dos demais passageiros, mas foi visto por um amigo que me avisou. Corri atrás e o abordei já perto do estacionamento. Na conversa rápida me perguntou se eu não estava com raiva dele (?) e disse que iria visitar amigos. Não tive tempo de questiona-lo, mas soube depois que compareceu em audiência no Fórum. Rendeu uma pequena nota na Folha de Dourados, que repercutiu bastante no site.
Quando finalmente o avião de Reinaldo deu o ar das graças no céu de brigadeiro, Lia Nogueira me perguntou algo que acabei confirmando, mas não me recordo o quê. Naquele papo ligeiro, ela vaticinou: “Zé, eu ainda vou ser prefeita de Dourados e você será meu secretário de Comunicação”. Fiquei surpreso com a pretensão dela e o com convite, não sabia que tinha prestígio com ela. Decerto pensei que “essa menina tá variando”. Prefeita de Dourados?
Semanas depois a encontrei sei lá aonde, e ela veio pra cima de mim, séria: “Pô, Zé, confiei em você e soltei uma informação errada (na verdade imprecisa) no ar”! Devo ter pensado: “Perdi minha boquinha”. E ela provavelmente levou uma bronca dos superiores.
Esse longo nariz de cera é uma digressão do que inspirou essa crônica, que é a recente festa que comemorou os 49 anos de Lia Nogueira. Na verdade, fiquei muito honrado com o convite e a constatação in loco de que tenho a amizade dela. Comemorou o primeiro aniversário como deputada ao lado da família e dos amigos (alguns na assessoria) das antigas e os mais recentes, gente em que ela confia. Não foi um evento político, como até eu imaginava. Pensa numa festa animada, que curti ao lado da Maria Antônia Ribeiro e do casal amigo Fernando Baraúna e Roseli da Luz Gonçalves.

Animada, depois de tirar fotos com convidados, passar pelas mesas e dançar, Lia se apoderou de um microfone e cantou algumas músicas para o deleite da já animadíssima plateia e surpresa, pelo menos para mim. Desconhecia o viés musical. Aí, numa das tiradas “de água do joelho”, onde também são jogadas rápidas conversas fora e narradas algumas resenhas, descobri, com um amigo militar dela, que a hoje deputada cantava em festivais de música e, em um deles, foi finalista com a música “Jogo Marcado”, de José Augusto e Paulo Sérgio Vale, sucesso cantado por Kátia, cujo refrão era “Ah, fogo que não quer passar”.

Parafraseando Geraldo Vandré, “Para não dizer que não falei (de política)”, os cumprimentos de aliados políticos, entre eles o governador Eduardo Riedel, o vice Barbosinha, o ex-governador Reinaldo Azambuja, os deputados Gerson Claro, Zé Teixeira e Gleice Jane foram exibidos num vídeo produzido pelo jornalista Antônio Coca – professor nos tempos da TV Caiuás, amigo de todas as horas e agora o assessor de imprensa de seu mandato.

Diga-se de passagem, que, de longe, Reinaldo foi o mais aplaudido pelos convivas, provavelmente por saberem do respeito, carinho e gratidão que Lia Nogueira tem por ele.
Para finalizar, recorro à célebre frase do filósofo alemão (1788–1860), Arthur Schopenhauer: “O destino embaralha as cartas, e nós jogamos”. Afinal, como entender o vaticínio de Lia Nogueira, no aeroporto, de que seria prefeita de Dourados, e que depois de 6 anos, agora como deputada depois de ter sido vereadora, seu sonho passa pelos mesmos atores que lá estavam, como Reinaldo, Geraldo, Zé Teixeira, Marçal e o PSDB partido pelo qual se elegeu deputada? Ela depende deles para disputar a Prefeitura e assim, se o povo quiser, materializar o sonho.

Agora, finalizando mesmo, concluo que o título da música de Katia, “Jogo Marcado”, justifica frase de Miguel Falabella: “As coincidências às vezes são soluções que a vida encontra pra mudar o rumo da história”.


