A indústria química levou ao governo um plano de R$ 70 bilhõee em novos investimentos que podem sair do papel caso seja ampliada a oferta de gás natural como matéria-prima para produtos como amônia, ureia, metanol e eteno. O plano foi apresentado ao Ministério de Minas e Energia (MME) por representantes de pesos-pesados do setor como Braskem, Dow Chemical, Rhodia, Yara, Air Liquide e Unigel.
De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), seis unidades produtivas foram fechadas entre 2011 e 2017, por causa dos altos preços do gás. Hoje o insumo chega às fábricas por até US$ 18 por milhão de BTU (unidade térmica britânica), enquanto o valor está abaixo de US$ 5 nos Estados Unidos e na Europa.
A aceleração da produção no pré-sal, entretanto, pode mudar completamente o panorama e impulsionar investimentos em projetos hoje engavetados. “Para isso, precisamos criar um mercado para o uso do gás natural como matéria-prima, que ainda não existe de forma consistente no Brasil. É necessário resolver o gargalo da oferta e reduzir o preço”, afirma o presidente-executivo da Abiquim, André Passos Cordeiro.
Os projetos levados pela associação ao MME são:
• Fábrica de fertilizantes, com cerca de 50% de execução pela Petrobras, em Três Lagoas (MS).
• Nova unidade de fertilizantes em Uberaba (MG).
• Planta de metanol (usado na produção de biodiesel) em localização ainda indefinida de Minas Gerais.
• Duplicação da unidade de fabricação de eteno (insumo para PET e defensivos agrícolas), da Braskem, em Duque de Caxias (RJ).
• Ampliação do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), hoje controlado pela Petrobras, em Itaboraí.
Hoje a indústria química consome cerca de 3 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural como matéria-prima para a fabricação de seus produtos, sem contar o uso do combustível fóssil como energia.
Esses projetos devem exigir mais 13 milhões de m³/dia. Uma aposta do setor é o bloco BM-C-33, operado pela norueguesa Equinor (com participação da Petrobras e da Repsol Sinopec) na Bacia de Campos, que receberá investimentos de US$ 9 bilhões e começará a produzir em 2028.
Em março, o MME anunciou a intenção de lançar o programa “Gás para Empregar”, que aguarda a criação de um grupo de trabalho interministerial para organizá-lo. Uma das ideias já ventiladas pelo ministro Alexandre Silveira é fazer um “swap” que permitiria ao governo trocar, nos contratos do pré-sal pelo regime de partilha, sua parte da produção em petróleo por gás.
Esse gás seria, então, leiloado pela estatal PPSA em contratos de fornecimento de longo prazo com o setor privado. Diante da certeza de oferta de gás a preços competitivos, a demanda seria criada com esses novos projetos industriais.
Conforme disseram fontes do governo à CNN, uma medida provisória para formatar esse tipo de operação está em discussões com a Casa Civil e o “swap” será uma opção — não uma obrigatoriedade — para as petroleiras. O MME não quis fazer comentários.
“O Brasil tem uma enorme oportunidade com o gás do pré-sal. Os volumes para os próximos cinco a dez anos são gigantescos”, diz Paulo Pedrosa, presidente da Abrace, a associação dos grandes consumidores industriais de energia.
Pedrosa pede cuidado, porém, com um desvirtuamento do que pode significar essa riqueza. Ele defende um uso mais intensivo do gás como matéria-prima para a indústria, mas não subsídios para gasodutos e mais usinas térmicas para geração de energia. “Esse gás natural tem que vir para descarbonizar a indústria, para o uso como matéria-prima, e não para carbonizar o setor elétrico”, afirma o executivo.
Hoje a indústria química opera com apenas 67% de sua capacidade instalada, segundo André Passos Cordeiro, o que representa o menor índice em 17 anos.
O presidente da Abiquim vê um processo de desindustrialização no setor, que poderá se acentuar caso não haja uma nova política para o uso do gás. Em 2010, a indústria química tinha um déficit comercial de US$ 10 bilhões.
Em 2022, o saldo negativo com outros países chegou a US$ 65 bilhões. Isso reflete o encarecimento da produção nacional e o aumento das importações. “Temos potencial para reduzir esse déficit pela metade, mas é preciso começar agora. Se nada for feito, logo passaremos para um patamar de US$ 100 bilhões de saldo desfavorável”, diz Passos Cordeiro.
(CNN)