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Livro mostra a importância do tereré como patrimônio de Mato Grosso do Sul

Por meio do projeto “Tereré: patrimônio cultural de Mato Grosso do Sul”, financiado pelo Fundo de investimentos culturais do Estado (FIC/MS), será lançado o livro sobre o surgimento da bebida e a sua importância para a história, cultura, economia e cotidiano sul-mato-grossense. A autoria é do professor Carlos Barros Gonçalves, da UFGD. O tereré foi registrado como patrimônio imaterial do Estado em 2011, contudo os estudos para esse fim tiveram origem em Ponta Porã, por meio da Secretaria de Turismo, em 2008.

Ele ressalta “que o estudo do Tereré não pode ser desvinculado da história mais ampla da erva-mate no antigo Sul de Mato Grosso, atual MS; embora o consumo da bebida, ou algo próximo ao que hoje chamamos, seja bem mais antigo e remete aos povos indígenas no continente, em especial os Guarani.

Segundo ele, nesse âmbito, é importante destacar dois aspectos. Primeiro, é comum falarmos que o tereré é de origem paraguaia, no entanto, o mais correto é dizer que se trata de uma bebida de origem Guarani, de origem indígena, que precede a formação do que hoje é o Paraguai.

“Obviamente não se pode negar que o tereré tem maior importância cultural no país vizinho como um todo, de acordo com Gonçalves. Aliás, no mesmo ano, em 2011, pouco meses antes de ser registrado como Patrimônio cultural de MS, o Paraguai declarou a bebida nacional e patrimônio cultural, instituindo o último sábado do mês de fevereiro como o Dia Nacional do Tereré. Já em 2020 a UNESCO reconheceu o modo de fazer do tereré paraguaio como patrimônio imaterial da humanidade.

Segundo o professor, isso não impede que a bebida seja elevada à condição de patrimônio cultural em outros locais, por outros agentes, como é o caso do estado de Mato Grosso do Sul. “Os bens culturais como festas, comidas, bebidas, modos de fazer etc. são dinâmicos, mudam com o tempo, adquirem novos sentidos, importância histórica e, sobretudo, não conhecem fronteiras”, afirma.

Sobre a importância da publicação, o professor afirmou que por ser um estado ainda jovem, acabou de completar seus 44 anos, há muita coisa para ser estudada, divulgada, ensinada, aprendida sobre as culturas, as identidades, as pessoas, os patrimônios, enfim, aquilo que marcaria ou que poderia marcar uma possível identidade, ou jeito de ser, sul-mato-grossense. Ressaltou ainda que por meio do tereré é possível revelar processos históricos mais amplos, como os relacionados à economia, às festas, às relações familiares, às amizades, ao lazer, às relações políticas, entre outras; nesse sentido o livro contribuirá para o campo da Educação e da Cultura, podendo ser utilizado em aulas de humanidades, bem como de educação patrimonial.

Conforme o Professor, a previsão é lançar a obra, impressa e digital (para download gratuito), ainda em 2022.  O projeto conta ainda com o perfil @projeto_terere_ms no instagram onde são divulgadas outras informações sobre o trabalho, bem como curiosidades, notícias, outras publicações relacionadas à erva-mate, à história e ao tereré.

Livro mostra a importância do tereré como patrimônio de Mato Grosso do Sul

O autor e o livro:

Trajetória pessoal e acadêmica.

Sul-mato-grossense nascido em Rio Brilhante, mas morador de Dourados desde os 7 anos, filho de pai paraguaio e mãe brasileira, sul-mato-grossense. Cursei a graduação e o mestrado em História na UFGD e o doutorado, também em História, na UFPR. Nesse percurso, também cursei uma especialização em Patrimônio cultural e gestão documental. Os temas voltados à história do MS, suas culturas e identidades sempre ocuparam lugar especial em minha trajetória pessoal, afetiva e mesmo profissional. Atualmente sou professor do Curso de Graduação em História da UFGD. Nesta Universidade atuo, desde 2005, no Centro de Documentação Regional, que é um espaço dedicado à preservação e disponibilização de acervos documentais, imagéticos e sonoros voltado aos estudos de temáticas regionais. Entre 2017 e 2021 também atuei junto ao Conselho Municipal de Patrimônio Cultural de Dourados.

Fala pra gente quando que você teve a ideia de explorar esse objeto de pesquisa. E os principais motivos.

Primeiro, a motivação afetiva. O tereré esteve muito presente em minha família e parentes; não apenas a bebida, mas outros elementos típicos de uma região fronteiriça e com forte presença de elementos culturais oriundos do Paraguai, como as polcas, o chamamé, a chipa, a sopa paraguaia, o locro, os bailes, o idioma Guarani, os “causos”. Quanto ao estudo, faz aproximadamente 10 anos; quando o tereré foi registrado como patrimônio imaterial do Estado em 2011. No ano seguinte, em 2012, iniciei o curso de especialização em Patrimônio Cultural, pela Universidade Tuiuti do Paraná, e foi lá que aprofundei o assunto, tanto em relação ao processo de patrimonialização da bebida, que teve início em 2008 na cidade de Ponta Porã, como à própria história do tereré, seu consumo, sua importância. Vale dizer que o estudo do tereré não pode ser desvinculado da história mais ampla da erva-mate no antigo Sul de Mato Grosso, atual MS; embora o consumo da bebida, ou algo próximo ao que hoje chamamos de tereré, seja bem mais antigo e remeta aos povos indígenas no continente, em especial os Guarani. Nesse âmbito, é importante destacar dois aspectos. Primeiro, é comum falarmos que o tereré é de origem paraguaia mas, o mais correto mesmo é falarmos que trata-se de uma bebida de origem Guarani, de origem indígena, que precede a formação do que hoje é o Paraguai. Os Guarani ocupavam uma vastíssima região que englobava não apenas o atual território do Paraguai, mas do próprio Brasil, da Bolívia e da Argentina. Obviamente não se pode negar que o tereré tem maior importância cultural no país vizinho como um todo; aliás, no mesmo ano, em 2011, pouco meses antes de ser registrado como Patrimônio cultural de MS, o Paraguai declarou o tereré uma bebida nacional e patrimônio cultural, instituindo o último sábado do mês de fevereiro como o Dia Nacional do Tereré. Já em 2020 a UNESCO reconheceu o modo de fazer do tereré paraguaio como patrimônio imaterial da humanidade. Segundo, é importante ressaltar que o fato de o tereré ter sido registrado, reconhecido primeiramente como um patrimônio cultural do Paraguai, e posteriormente da humanidade, não impede que a bebida seja elevada à condição de patrimônio cultural em outros locais, por outros agentes, como é o caso do estado de Mato Grosso do Sul. Os bens culturais como festas, comidas, bebidas, modos de fazer etc. são dinâmicos, mudam com o tempo, adquirem novos sentidos, importância histórica e, sobretudo, não conhecem fronteiras.    

Que pé que está? Existe algum prazo para o lançamento?

O projeto Tereré: patrimônio cultural de MS está sendo executado via Fundo de Investimentos Culturais (FIC), da Fundação de Cultura de MS, desde o mês de julho último. Por se tratar de uma pesquisa que já estava, há anos, em desenvolvimento, o texto em si, já está próximo de 70% concluído. A previsão é lançar a obra, impressa e e-book, ainda em 2022. Nesse momento estou investindo na divulgação do Projeto em si, especialmente por meio das redes sociais, como uma forma de ampliar os conhecimentos a respeito da bebida, bem como da erva-mate e sua importância para o Estado.

Por que considera importante realizar e publicar este estudo?

Mato Grosso do Sul é um Estado que pode ser considerado jovem; acabou de completar seus 44 anos. Embora a criação desse ente federativo não tenha surgido de uma hora para outra, há muita coisa para ser estudada, divulgada, ensinada, aprendida sobre as culturas, as identidades, as pessoas, os patrimônios, enfim, aquilo que marcaria ou que poderia marcar uma possível identidade, ou jeito de ser, sul-mato-grossense. Vale lembrar – e para isso o tereré é um ótimo exemplo – que esse modo, jeito de ser sul-mato-grossense, é carregado de elementos, traços culturais do país vizinho, o Paraguai, bem como dos povos indígenas que aqui, há muito, habitam. Desse modo, por meio do tereré é possível revelar processos históricos mais amplos, como os relacionados à economia, às festas, às relações familiares, às amizades, ao lazer, às relações políticas, entre outras. Além desses aspectos, o livro contribuirá para o campo da Educação, podendo ser utilizado em aulas de humanidades, bem como de educação patrimonial.

A pesquisa foi feita com base em que? Documentos né? Como funciona esse tipo de pesquisa?

No campo da História profissional tudo pode ser tomado como documento, pois permite ao historiador ler os vestígios do passado que pretende estudar. Nesse âmbito também se encontram os documentos geralmente chamados de oficiais, ou seja, aqueles produzidos por instituições estatais, por exemplo; assim, parte das reflexões do livro se dará com a leitura dos documentos que compõem o processo de registro do tereré pelo Estado, bem como recortes de jornais, imagens, músicas, obras literárias e acadêmicas, as fontes produzidas a partir das redes sociais, como os memes, os comentários a postagens relacionadas ao assunto, embalagens de erva-mate, entre outros. Há uma variada estética produzida a partir do tereré, da erva-mate.

O consumo de tereré remete ao século XVI e XVII? Chegou a ser condenado por padres e depois incentivado? Como foi possível descobrir esses detalhes? Pode falar um pouco mais sobre as informações que você levantou sobre este período.

Entre as fontes consultadas há uma série textos intitulados La yerba del diablo, publicados pelo grande historiador e teólogo jesuíta Bartomeu Melià, falecido há dois anos, na Revista Accion (Revista Paraguaya de Reflexión y Diálogo publicada pelo Centro de Estudios Paraguayos Antonio Guasch-CEPAG) a partir de 1995. Além de dados sobre o consumo da erva como bebida pelos índios Guarani que eram alvos dos jesuítas no século XVII, os textos informam sobre as supostas origens sobrenaturais do vegetal e os aspectos positivos e negativos presentes na história do uso do mate, como por exemplo, o de funcionar como uma espécie de estimulante, além de refresco para os dias quentes. As fontes, digamos, primárias, para esse tipo de informação são as cartas/relatórios dos próprios jesuítas, como o padre Antonio Sepp; tais materiais já foram publicados e alguns encontram-se disponíveis on-line.

Em algumas embalagens de erva-mate industrializada, em obras memorialistas, em publicações gerais na internet, também é possível encontrar alegações de que o consumo de erva-mate com água fria – que no caso seria com temperatura ambiente – remontaria, ou estaria presente, em períodos anteriores aos séculos XVI e XVII, entre os povos andinos da atual Bolívia, Peru, Chile. Esses são alguns aspectos sobre os quais o livro pretende lançar alguma luz. O que posso dizer, nesse momento, é que é muito difícil precisar uma origem, um início, ao que hoje chamamos de tereré. O certo mesmo é que se trata de uma prática alimentar antiga e que sofreu adaptações, invenções e reinvenções ao longo do tempo, do espaço.

Importante dizer também que, antes de ser um patrimônio oficializado pelo Estado de MS, a bebida era “oficializada”, reconhecida pelas próprias pessoas do Estado, tamanha a sua presença, importância no cotidiano das gentes que aqui habitaram e habitam, bem como dos países vizinhos.

Aproveito para pedir que as pessoas sigam a página @projeto_terere_ms no Instagram, curtam e compartilhem as postagens, as informações, bem como coloco-me à disposição para receber informações, materiais, sugestões e críticas.

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